20º Æthyr: KHR
Este artigo é um capítulo de A Visão e a Voz
O clamor do vigésimo Ar ou Æthyr, chamado KHR
O Clamor do 20º Æthyr, chamado KHR ¶
O orvalho que estava sobre a face da pedra se foi e ela se tornou algo como uma poça de água límpida e dourada. E agora a luz entrou na Rosa Cruz. No entanto, tudo o que vejo é a noite, com as estrelas ali, como elas aparecem através de um telescópio. E surge um pavão na pedra, enchendo todo o Ar. É como a visão chamada Pavão Universal, ou melhor, como uma representação daquela visão. E agora há incontáveis nuvens de anjos brancos enchendo o Ar conforme o pavão se dissolve.
Agora, atrás dos anjos, há arcanjos com trombetas. Isso faz com que todas as coisas apareçam de uma só vez, de modo que há uma tremenda confusão de imagens. E agora percebo que todas essas coisas são apenas véus da roda, pois todas elas se reúnem em uma roda que gira com velocidade incrível. Tem muitas cores, mas todas vibram com a luz branca, de forma que são transparentes e luminosas. Essa única roda tem quarenta e nove rodas colocadas em ângulos diferentes, de modo que compõem uma esfera; cada roda tem 49 raios e 49 aros concêntricos a distâncias iguais do centro. E onde quer que os raios de quaisquer duas rodas se encontrem, há um clarão ofuscante de glória. Deve ser entendido que embora muitos detalhes estejam visíveis na roda, ainda assim, ao mesmo tempo, a impressão é de um objeto único e simples.
Parece que esta roda está sendo girada por uma mão. Embora a roda preencha todo o Ar, a mão é muito maior do que a roda. E embora esta visão seja tão grande e esplêndida, ainda assim não há seriedade nela, ou solenidade. Parece que a mão está girando a roda apenas por prazer, ou melhor dizendo, diversão.
Uma voz chega: Pois ele é um deus jocoso e corado, e sua risada é a vibração de tudo o que existe, e os terremotos da alma.
A pessoa tem consciência do zumbido da roda que a faz vibrar, como uma descarga elétrica passando por ela.
Agora vejo as figuras na roda, que foram interpretadas como a Esfinge com espada, Hermanúbis e Tifão. E isso está errado. O aro da roda é uma vívida cobra esmeralda; no centro da roda há um coração escarlate; e, impossível de explicar como é, o escarlate do coração e o verde da cobra são ainda mais vívidos do que o brilho branco ofuscante da roda.
As figuras na roda são mais escuras do que a própria roda; na verdade, são manchas na pureza da roda e, por essa razão, e por causa do giro da roda, não consigo vê-las. Mas no topo parece estar o Cordeiro e a Bandeira, como se vê em algumas medalhas cristãs, e uma das coisas mais de baixo é um lobo e a outra um corvo. O símbolo do Cordeiro e da Bandeira é muito mais brilhante do que os outros dois. Ele fica cada vez mais brilhante, até que agora ficou mais brilhante do que a própria roda e ocupa mais espaço do que ela ocupava.
Ele fala: Eu sou o maior dos enganadores, pois minha pureza e inocência seduzirão os puros e inocentes, que apenas por mim deveriam chegar ao centro da roda. O lobo só trai os gananciosos e os traiçoeiros; o corvo só trai os melancólicos e os desonestos. Mas eu sou aquele sobre quem foi escrito: Ele enganará os próprios escolhidos.
Pois no princípio o Pai de todos invocou espíritos mentirosos para que pudessem peneirar as criaturas da terra em três peneiras, de acordo com as três almas impuras. E ele escolheu o lobo para a lascívia da carne e o corvo para a lascívia da mente; mas ele escolheu acima de tudo simular a inspiração pura da alma. Aqueles que se tornaram presa do lobo e do corvo eu não feri; mas aqueles que me rejeitaram, entreguei à ira do corvo e do lobo. E as mandíbulas de um os rasgaram, e o bico do outro devorou os cadáveres. Portanto, minha bandeira é branca, porque nada deixei vivo na terra. Eu mesmo banqueteei com o sangue dos santos, mas os homens não suspeitam que eu seja seu inimigo, pois minha lã é branca e quente, e meus dentes não são os dentes de quem dilacera a carne; e meus olhos são tenros, e eles não me conhecem como chefe dos espíritos mentirosos que o Pai de todos enviou diante de sua face no princípio.
(Sua atribuição é sal; o lobo mercúrio e o corvo enxofre.)
Agora o cordeiro fica pequeno novamente, e novamente não há nada além da roda e da mão que a faz girar.
E eu disse: “Pela palavra de poder, dupla na voz do Mestre; pela palavra que é sete, e um em sete; e pela grande e terrível palavra 210, eu te imploro, Ó meu Senhor, que conceda-me a visão da tua glória”. E todos os raios da roda fluem em minha direção, e sou destruído e cegado pela luz. Estou preso dentro da roda. Eu sou um com a roda. Eu sou maior do que a roda. Estou em meio a uma miríade de relâmpagos e vejo o rosto dele. (Sou lançado violentamente de volta à terra a cada segundo, de modo que não consigo me concentrar totalmente.)
Tudo o que se obtém é uma chama líquida de ouro pálido. Mas sua força radiante continua me atirando de volta.
E eu digo: Pela palavra e pela vontade, pela penitência e pela oração, deixa-me ver o teu rosto. (Não consigo explicar isso, há confusão de personalidades.) Eu que falo com você, vejo o que eu lhe digo; mas eu, que o vejo, não consigo comunicá-lo a mim, que falo a você.
Se alguém pudesse contemplar o sol ao meio-dia, isso poderia ser como a substância dele. Mas a luz é sem calor. É a visão de Ut nos Upaniṣadas. E dessa visão surgiram todas as lendas de Baco, Kṛṣṇa e Adônis. Pois a impressão é de um jovem dançando e fazendo música. Mas você deve entender que ele não está fazendo isso, pois ele está quieto. Até mesmo a mão que gira a roda não é a mão dele, mas apenas uma mão energizada por ele.
E agora é a dança de Śiva. Eu me deito sob os pés dele, seu santo, sua vítima. Minha forma é a forma do deus Phtah, em minha essência, mas a forma do deus Seb é minha forma. E esta é a razão da existência, que nesta dança que é deleite, deve haver o deus e o adepto. Além disso, a própria terra é um santo; e o sol e a lua dançam sobre ela, torturando-a com deleite.
Essa visão não é perfeita. Estou apenas no átrio exterior da visão, porque a empreendi a serviço do Santo e devo manter os sentidos e a fala. Nenhuma visão registrada é perfeita, de visões elevadas, pois o vidente deve manter seus órgãos físicos ou sua memória funcionando. E nenhuma delas é capaz. Não há uma ponte. Só se pode ter consciência de uma coisa de cada vez e, à medida que a consciência se aproxima da visão, ela perde o controle do físico e do mental. Mesmo assim, o corpo e a mente devem estar muito perfeitos antes que qualquer coisa possa ser feita, ou a energia da visão pode enviar o corpo a espasmos e a mente à loucura. É por isso que as primeiras visões dão Ānanda, o que é um choque. Quando o adepto está sintonizado com o Samādhi, há apenas uma paz sem nuvens.
Essa visão é particularmente difícil de entrar, porque ele sou eu. E, portanto, o ego humano está sendo constantemente excitado, de modo que a pessoa volta com tanta frequência. Uma prática de meditação acêntrica como Mahāsatipaṭṭhāna deve ser feita antes das invocações do Sagrado Anjo Guardião, para que o ego possa estar pronto para se entregar totalmente ao Amado.
E agora a brisa sopra sobre nós, como os suspiros de amor insatisfeito – ou satisfeito. Seus lábios se movem. Não consigo dizer as primeiras palavras.
E depois: “Não trarás tu os filhos dos homens à visão de minha glória? ‘Somente o teu silêncio e a tua palavra que me adoram têm valor’. ‘Pois assim como eu sou o último, também sou o próximo, e como o próximo tu me revelarás à multidão’. Não temas por nada; não te desvies por nada, eremita de Nuit, apóstolo de Hadit, guerreiro de Ra Hoor Khu! Pegai o fermento, e o pão será doce; o fermento funciona, e o vinho será doce. Meus sacramentos são alimento vigoroso e loucura divina. Vinde a mim, Ó vós filhos dos homens; vinde a mim, em quem eu estou, em quem vós estais, onde só estais vivos com a vida que permanece na Luz”.
Todo esse tempo eu estive desaparecendo. Eu afundo. O véu da noite desce em um tom cinza-azulado opaco com um pentagrama no meio dele, aquoso e opaco. E devo permanecer lá por um tempo antes de voltar para a terra. (Mas fecha a janela, esconda-me do sol. Ó, fecha a janela![1])
Agora, o pentagrama está desbotado; cruzes pretas preenchem o Æthyr crescendo gradualmente e se entrelaçando, até que haja uma rede.
Está tudo escuro agora. Estou deitado exausto, com a ponta afiada da pedra cortando minha testa.
Bou Saâda.
30 de novembro de 1909. 9h15 às 10h50.
Isso foi feito. – O.V. ↩︎
Traduzido por Alan Willms em 2021. Revisado por Lucas Fortunato em 2021.