Os "Milagres" e as Alucinações

Este artigo é um capítulo de Ataque e Defesa Astral

Sobre a influência de forças sutis na vida humana e os habitantes do Astral.

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Os "Milagres" e as Alucinações

Na época em que Aleister Crowley já era chamado de “pior homem do mundo” pela imprensa marrom do seu país e por publicações católicas romanas em latim, havia em Londres um livreiro a quem ele muito estimava pela sua honestidade e devoção à literatura especializada em ocultismo, a quem encomendava livros raros, e cuja loja visitava regularmente. Numa dessas ocasiões, o livreiro queixou-se, brincando mas meio a sério, de que, apesar da reputação de Crowley como #feiticeiro” e “mago negro”, ele nunca vira o magista praticar nenhum portento.

Crowley ponderou. – Em atenção à sua pessoa – ele disse – e somente por isto, vou fazer algo que raramente faço. Feche os olhos.

O livreiro fechou seus olhos alacremente.

- Abra-os – disse Crowley.

O livreiro abriu os olhos. Suas estantes, poucos segundos antes abarrotadas de primeiras edições preciosas e caríssimas, estavam completamente vazias.

Imagine-se a ansiedade do proprietário! Mas após um momento Crowley disse-lhe que fechasse os olhos novamente, e quando os reabriu seu estoque tinha voltado ao normal.

Deve ser inútil acrescentar que nunca mais o livreiro exigiu “milagres” do seu estranho cliente!... (1)

Em ainda outra ocasião, o famigerado “satanista” foi convidado a uma reunião social por uma anfitriã londrina que gostava de colecionar intelectuais entre seus hóspedes. Era noite, inverno, e a lareira estava apagada. Em tom de pilhéria, os “intelectuais” presentes sugeriram a Crowley que usasse seus poderes mágicos para atear fogo à lareira.

- Ó, pois não – disse o magista.

Ele fez um gesto e pronunciou uma palavra: a lenha na lareira imediatamente explodiu em chamas.

Não se falou mais em magia durante o resto da noite. (2)

Estes milagrezinhos eram bastante raros, e sem dúvida medíocres se comparados com os absurdos fenômenos atribuídos a Crowley por gente sem consciência nem escrúpulos; o que há de importante quanto a eles é que nunca foram negados pelo autor, e foram relatados por pessoas de relativa probidade e isenção.

Nada há de fantástico em tais fenômenos; não são “maiores” nem “melhores” do que os atribuídos a diversos taumaturgos através dos tempos – entre outros, o lendário “Jesus” dos crististas. Mas verdadeiros iniciados raramente executam façanhas que pareçam contrariar as leis naturais, e detestam “milagres” do tipo que produz alucinação coletiva: primeiro, porque fenômenos não são prova, quer da probidade moral dos seus autores, quer da validade das doutrinas por eles defendidas; segundo, porque quaisquer “milagres” representam um desperdício de energia que pode ser mais eficientemente aplicada em outros projetos – como, por exemplo, a evolução espiritual da espécie humana.

Nosso caso chega a ser embaraçoso: aspirantes vêm à nossa presença com olhos suplicantes, e notamos que esperam de nós, pelo menos, a tradicional auréola; aspiram à ressurreição dos mortos (eles, é claro), e ficam bastante aborrecidos quando percebem que não estamos dispostos a emular a teatralidade dos ilusionistas, a verborréia dos charlatães, ou a desonestidade dos políticos.

Nunca ambicionamos sequer os “poderes” tradicionais de Patanjali: a única faculdade que nos foi permitida é aquela de ajudar as pessoas que assim desejarem na busca e descoberta de suas Verdadeiras Vontades. Nem podemos fazer mais que orientar e aconselhar. Nessa procura, cada aspirante tem que dar o primeiro passo.

Não nos surpreende, portanto, que a maioria dos nossos pretensos “discípulos” nos abandone a meio caminho, assim que percebem que longe de estarmos dispostos a nos sacrificarmos por eles, esperamos pacientemente (3) que eles se disponham a trabalhar, e se necessário a se sacrificar, não só por Eles Mesmos, mas pela Ordem, e até por nós!...

Mas o nosso é um caso à parte: Crowley certamente possuía poderes mágicos; mas com a mesma certeza, raramente os usava. Como todo verdadeiro Mestre, ele se abstinha de misturar os planos.

Fenômenos realizados por iniciados podem ser executados de duas maneiras principais: ou através de projeção telepática por parte de uma mente treinada, ou através de entidades dos planos sutis que, por um motivo ou por outro, estão dispostas a obedecer ao magista.

No caso dos livros do Sr. Atkins, Crowley pode ter visualizado as estantes vazias, e projetado esta visualização no cérebro do seu conhecido, produzindo uma alucinação momentânea exatamente análoga àquela produzida por uma sugestão hipnótica; ou pode ter comandado um dos seus “familiares” a que estimulasse diretamente no cérebro do Sr. Atkins a falsa percepção.

No caso da lenha que “pegou fogo sozinha”, foi um fenômeno de telecinésia. Certos iniciados têm, por constituição, facilidade para a produção de algum tipo particular de fenômeno elemental. Crowley simplesmente demonstrou sua afinidade com o Elemento Fogo. (4)

Tais fenômenos seriam patéticos se fossem encarados com seriedade, quer pelo magista, quer pelos seus seguidores. Muito mais importante que os “milagres” de Crowley tem sido a inegável revolução psíquica que data de abril de 1904 e.v., quando ele recebeu o Livro da Lei. Está escrito: “Conhecê-los-eis pelos seus frutos”.

Dizem que o “Cristo” evangélico ressuscitou os mortos, inclusive a si mesmo. É pena que, em mil e seiscentos anos do cristismo, não tenha conseguido ressuscitar honra ou caridade entre os cristãos.

Mesmo quando fenômenos mágicos são legítimos, raramente são eficientes: o autor da Magia Sagrada de Abramelin, por exemplo, se gaba de ter ressuscitado um morto e animado o cadáver com um demônio (5) apenas para garantir a sucessão dinástica de uma família nobre da Alemanha medieval; mas o sucessor do morto (que ainda era menor de idade na época em que este falecera realmente, e teria sido então preterido por um tio) perdeu, em poucos anos, por pura incompetência, a herança que lhe fora tão carinhosamente – e “milagrosamente” – garantida pelo magista.

Ele se gaba, também, de ter levantado dois mil soldados ilusórios (6) para auxiliar um seu amigo nobre numa batalha em que este, de outra forma, teria sofrido inferioridade numérica; e a história da época comprova efetivamente, que uma quantidade de soldados inesperados e desconhecidos vieram reforçar as fileiras daquele aristocrata; mas, se bem que o protegido do magista tenha ganhado a batalha, ele terminou por perder a guerra.

Em época mais recente, o assim-chamado “Mestre” Philippe, um iniciado francês que chegou ao grau de Adepto, mas que enveredou por uma linha inecológica de ação mágica, protegeu com seus poderes a família imperial dos Romanov, a quem devia favores, e profetizou-lhes que enquanto ele fosse vivo nada teriam a temer dos Bolcheviques; mas à morte do magista, a família dos Czares foi totalmente dizimada, e a Rússia ingressou no exagero que é o comunismo.

O Carma, isto é, a Lei de Compensação, é infalível. Sábios são aqueles iniciados que a levam sempre em conta em seu trabalho! O Universo está entretecido em um continuum; não há ação sem reação possível. Como diz o Clássico de Pureza:

Ah! Contato com tudo,
Plástico toque, e exato,
De tudo o manto, livre no entanto,
Fora de cada Ato!

Quem tiver isto, chega
Pouco a pouco, um suspiro,
Ao ancestral Mistério do Tao
E some em seu Retiro.

Homens o chamam Mestre;
Mas, ele manda em quem?
Raiz-Motivo de tudo vivo,
Ele não manda em ninguém!

Lao Kun (7) o Mestre disse:
O Adepto que é perito
Nunca tem meta, enquanto o pateta
Sempre persegue um fito.

Quem mais possui o Teh
Oculta o seu poder.
Quem menos tem o exibe, porém:
Tem sempre algo a fazer.

Quem exibe Poderes,
Quem qual tesouro os vê,
Gente é sem arte, sem sequer parte
De Tao, e até de Teh.

A utilização de entidades demoníacas é sempre perigosa para o equilíbrio ecológico entre os planos. Estas entidades exacerbam e fortificam os movimentos egóicos. É possível que Crowley tenha utilizado tais entidades na livraria de John Watkins; se assim foi, note-se que o magista escolheu cuidadosamente o tipo de fenômeno a ser produzido com duas finalidades básicas: 1) Satisfazer o ingênuo desejo de Watkins, a quem Crowley estimava por sua probidade e caráter; 2) Desencorajar o livreiro de qualquer pedido de repetição de fenômenos no futuro, ao ameaça-lo subliminarmente com a possibilidade de um enorme prejuízo financeiro.

Quanta sutileza e sabedoria contida no planejamento e execução de um fenômeno tão banal! E mesmo que Crowley não tivesse diretamente utilizado entidades demoníacas em sua produção, ainda assim ele teria exercido a mesma precaução; pois como o ser humano existe em todos os planos, o ser humano partilha da substância de todos os planos; e é perigoso perturbar o relacionamento normal entre eles. Isto ocorre toda vez que um “milagre” é produzido.

Em dezembro de 1929 e.v. uma respeitadíssima revista especializada inglesa, The Occult Review, publicou uma carta ao editor, assinada H. Campbell, no seguinte teor:

“Desejando certa informação que eu não podia obter de nenhuma maneira usual, recorri ao Sistema de Abramelin, e para isto preparei uma cópia do talismã apropriado, aperfeiçoando-a com a minha melhor habilidade e de acordo com o meu parco conhecimento e experiência. (8) Após executar o ritual, eu passei ao processo de limpar o meu local de trabalho astralmente. A prática baseada em pouco conhecimento é sempre perigosa: meu ritual era imperfeito ,(9) e tudo o que consegui foi inutilizar o talismã, sem em nada impedir as atividades da entidade invocada. Isto parece nada ser senão um grosseiro descuido de minha parte, e até certo ponto assim é; mas o que desejo tornar claro é que meu conhecimento desse particular sistema, e portanto o meu ritual, eram imperfeitos. De qualquer maneira, não me havia sido demonstrado nenhum método de combater essa particular entidade, uma vez provocada. (10)

“Agora, notem os resultados. Infelizmente não sei ao certo em que data os fenômenos começaram, mas o primeiro indício de que havia um problema deve ter aparecido por volta de 3 de março de 1927. Posso calcular a data porque, como pude verificar posteriormente, as manifestações eram sempre mais fortes pro volta da lua nova, e após eu ter ido para a cama dormir. Nessa ocasião eu me lembro de ter despertado subitamente, com um vago sentimento de horror me oprimindo. Não se tratava do horror que acompanha um pesadelo: era como se fosse uma emoção que estava sendo provocada em mim de alguma fonte externa a mim mesmo, a qual podia ser repelida por um esforço da vontade. Isto passou quase que no momento em que me levantei, e não pensei mais no assunto.

“Novamente, no dia 2 de abril, ou em data aproximada, (11) eu fui acometido pela mesma sensação; mas considerei-a não mais que um severo pesadelo, embora o fato de que meu sono estava sendo perturbado perto da lua nova me tivesse ocorrido. Ao aproximar-se a lua cheia, as noites eram novamente pacíficas.

“A lua nova de 1 de maio trouxe uma repetição do problema. Desta vez a sensação de horror foi muito mais forte, e necessitou um esforço de vontade quase intolerável para dissipa-la. Também, foi por volta desta ocasião que eu vi pela primeira vez a entidade que estava rapidamente me obcecando. Não era propriamente feia de aspecto: seus olhos estavam fechados, e era barbada, com longos cabelos em sua volta. Pareceu-me como uma força cega pouco a pouco despertando-se para a atividade. (12)

“Agora, há três pontos que devo tornar bem claros antes de prosseguir este relato: em primeiro lugar, nunca fui atacado duas vezes na mesma noite. Em segundo lugar, quando falo de fenômenos físicos experimentados por mim, tais como vidros se espatifando, ou vozes, eles nunca (com uma exceção única e absolutamente inexplicável) foram realmente fenômenos materiais, mas apenas alucinações. Isto me leva ao terceiro ponto: nenhum destes incidentes ocorreu enquanto eu estava dormindo. Sempre, eu me senti acordar com o terror me envolvendo como uma nuvem, e lutando para dispersa-lo. Eu já tive pesadelos; mas nenhum pesadelo que já tive prendeu a minha mente durante minutos a fio, como fez esta coisa, nem me levou a pular de uma janela de mais de três metros de altura.

“A primeira indicação que tive de que estas visitas eram absolutamente fora do normal veio no dia 30 de maio. Por volta da meia-noite eu fui subitamente acordado por uma voz gritando: ‘Cuidado!’ Imediatamente me tornei cônscio de uma serpente rubra coleando e se enrodilhando e se estendendo debaixo da minha cama, e esticando sua cabeça para fora ao longo do assoalho. Ela estava a ponto de me dar um bote quando pulei para minha janela, e caí no jardim, num canteiro de rosas debaixo do meu quarto. Felizmente, meu único ferimento foi um braço machucado.

“Depois disto houve paz absolutamente até 30 de junho, quando o verdadeiro clímax veio. Eu vira a coisa novamente na noite da lua nova, e notara consideráveis mudanças em sua aparência. Especialmente, ela parecia muito mais ativa, e seus longos cabelos tinham se transformado em cabeças de serpentes. Na noite seguinte eu fui acordado por violento barulho, e pulei da cama. Vi então que o barulho fora causado por um grande obelisco vermelho que atravessara a parede ocidental do meu quarto e agora estava apoiado contra a parede leste. Ele tinha arrebentado tanto esta parede quanto a janela, mas não tinha atingido a minha cama, a qual estava em um nicho para a esquerda da sua trajetória. Em seu trânsito o obelisco despedaçara todos os espelhos, e tanto o assoalho quanto o topo da minha cama estavam cobertos de estilhaços e farpas. Desta vez, a alucinação deve ter durado alguns minutos: eu não me atrevia a mover-me por medo de me cortar, e para alcançar os fósforos – nos quais, eu sabia, estava a salvação (13) – eu teria que me estender por sobre a cama, e novamente arriscar cortar-me nos estilhaços. No entanto, em meu íntimo, eu sabia que tudo isso era falso, mas não tinha poder para me mover. Eu podia apenas ficar de pé ali, incapaz, olhando o quarto arrebentado, num estado de terror impotente.

“E agora vem a parta mais extraordinária de tudo isto. Quando eu finalmente dominei a obsessão e voltei à cama, completamente exausto, sei que o único som que fiz aquela noite foi ao pular do leito para o assoalho. Além disto, meu quarto fica pelo menos a cem metros de distância do resto da casa; no entanto, na manhã seguinte, na hora do café, minha família me perguntou por que houvera um ruído tão grande no meu quarto durante a noite. (14)

“Depois disto, eu percebi que acabara a brincadeira. Eu não havia aturado essas ocorrências sem fazer nada; mas percebi que me era impossível tentar controlar a força que eu pusera em movimento. Em desespero, recorri a uma boa amiga, a qual, eu sabia, tinha muita experiência dessas coisas. Ela não hesitou, e veio imediatamente em meu auxílio; daquele dia até hoje nunca mais experimentei coisa alguma desse tipo. (15)

“Este é o caso, espero que sirva de aviso àqueles que lerem esta confissão da minha asneira, para que tratem com o máximo cuidado todos os sistemas de magia impressos em livros, e não os usem de forma alguma, a não ser que tenham o mais completo controle das entidades invocadas”.

Nem sempre “milagres” necessitam o uso de uma mente treinada projetando telepaticamente, ou a obediência de uma entidade de outra linha evolutiva. O magista que treinou seu corpo astral, por exemplo, dispõe de “poderes” fora do normal – no sentido estatístico desta palavra.

Em certa ocasião Allan Bennett (conhecido na A.’.A.’. como Iehi Aour) estava descendo uma rua londrina quando foi grosseiramente abordado por um indivíduo que lhe disse não acreditar em magia e que desafiou o pacato místico a dar uma prova de que ela existia. Bennett tocou no incrédulo com um dedo: ele caiu como se fulminado, e passou vários dias em estado de coma.

Esta façanha não pode ser duplicada por qualquer um: ela indica um grande desenvolvimento do corpo astral, e alto controle deste. O magista simplesmente golpeou seu interlocutor astralmente, e a desorganização produzida no corpo astral deste repercutiu no corpo físico. Não cremos nem por um instante que fosse a intenção de Bennett matar o grosseirão, pois ele poderia ter feito isto se quisesse. Ainda em outra ocasião, Crowley (que aprendeu os rudimentos de magia e ioga com Bennett) estava em um ambiente vulgar, entre vários desconhecidos, com um gramofone tocando música barata a todo volume; exasperado, o magista bradou:

- Abaixem essa coisa ou eu mato todo mundo aqui dentro!

O gramofone foi abaixado imediatamente.

Note-se que as pessoas presentes não conheciam a identidade de Crowley em suas consciências puramente mundanas; mas o Magus representa a nossa espécie inteira, e em certos níveis do Buddhi Manas (ou “Corpo Moral”) ele é imediatamente reconhecido quando irradia naquele nível. (16)

Algum leitor poderá perguntar aqui o que teria acontecido se o gramofone não tivesse sido abaixado. Em nossa opinião, Crowley teria fulminado astralmente todas as pessoas presentes. Isto, sem dúvida, não é um gesto digno de um “Mestre” no sentido lacrimogêneo que os teosofistas de Besant e Leadbeater dão a esta palavra; mas o Mestre, enquanto encarnado, é um ser humano como qualquer outro em sua base física, e tem seus momentos de impaciência e de cólera. Um dos poucos incidentes do Novo Testamento que consideramos genuíno, e atribuível a algum verdadeiro místico judaico, é aquele que descreve o chicoteamento dos vendilhões do Templo. Provê, em nossa opinião, uma lição moral que nunca foi aproveitada pela Igreja Romana;, uma lição bem mais elevada que qualquer outra que possa ser extraída dos ridículos “milagres”, ou da sadomasoquista “crucifixão”.

Nunca é demais repetir que o corpo astral realmente existe, e pode ser desenvolvido, sistematicamente e cuidadosamente, por qualquer ser humano. Infelizmente para os apressados, seu desenvolvimento exige mais paciência e mais persistência ainda do que o desenvolvimento atlético do corpo físico, porque o corpo astral é uma aquisição recente (em termos de centenas de milhares de anos) da nossa espécie. A herança genética nos permite um desenvolvimento físico relativamente rápido, porque há centenas de milhares de anos que nossa espécie desenvolve rapidamente o corpo físico para enfrentar os problemas do meio ambiente material. O corpo astral é um desenvolvimento recente, uma especialização; ou, se quiserem um luxo. Seu desenvolvimento ainda é tão raro que o código genético necessário para isto ainda não está automaticamente programado; ou se está, isto é apenas numa minoria de indivíduos em cada geração.

Os fenômenos astrais, conseqüentemente, são pouco conhecidos, e cercados de lendas, exageros, boatos, e mentiras. Mas eles existem. O que é ainda mais interessante, eles parecem contradizer as leis do contínuo material em certas direções. Por exemplo: sabemos que no espaço físico dois corpos não podem ocupar o mesmo lugar ao mesmo tempo; mas tal não ocorre no astral, onde interpenetração “espacial” pode se processar no mesmo instante de “tempo”. (17)

Outro fenômeno muito curioso é a defasagem temporal. Em sua autobiografia, Aleister Crowley relata uma série de experimentos conduzidos com uma Irmã da Ordem, em que ele a visitava astralmente, embora separados por milhares de quilÔmetros no espaço físico. Ambos registravam pormenorizadamente os incidentes de tais visitas, e foi possível constatar que as descrições coincidiam de maneira a eliminar qualquer possibilidade de imaginação ou sonho. Mas uma circunstância se tornou clara: frequentemente, as visitas de Crowley haviam terminado para Crowley antes de começarem para a Irmã.

Essa experiência de Crowley e da Irmã não é única: outros investigadores têm comprovado que o tempo – tal como o compreendemos – é uma dimensão que sofre alteração em fenômenos astrais. Esta alteração ainda não foi matematicamente determinada. Cientistas estão começando a se interessar pelo estudo de radiações eletromagnéticas de origem biológicas, e é possível que uma pesquisa cuidadosa por parte de futuros investigadores venha a estabelecer as variantes desta equação.

Pesquisadores de fenômenos ocultos devem antes de mais nada estudar os rudimentos da matemática e do método científico (tal como este é explicado, por exemplo, nas obras do brilhante físico e matemático francês Poincaré). Sabemos já que não somos a única espécie inteligente habitando este planeta: os cetáceos, entre outros, nos igualam em complexidade e amplitude de raciocínio, e recentes experiências com os antropóides parecem indicar que eles são muito mais inteligentes do que os nossos antepassados suspeitavam.

Devemos levar em conta, também, que a evolução de todas as espécies vivas está interligada; quanto mais uma aumentar em inteligência e percepção, tanto mais as outras parecerão aumentar, ou realmente aumentarão, em sabedoria e perspectiva. O ditado anglo-saxão “A beleza está nos olhos de quem a vê” pode ser aplicado igualmente à inteligência. Não é verdade que as pessoas estúpidas percebam a inferioridade da sua inteligência; se assim fosse, teriam em si pelo menos a semente do progresso. Para o estúpido, todos são estúpidos, e até mais do que ele: pois ele não consegue perceber a motivação que impele intelectos melhores. Mas para a pessoa inteligente, a vida é uma descoberta contínua cujo interesse se expande e se amplia.

(1) Este livreiro era o Sr. John Watkins, cuja loja ainda existe em Londres, homem respeitadíssimo no seu círculo de atividades. Esta história foi contada por ele mesmo, e nunca por Crowley.

(2) Esta anedota vem relatada numa reminiscência sobre o “por homem do mundo” publicada pela famosa revista humorista Punch, na Inglaterra.

(3) Bom, nem sempre.

(4) Nem é necessário sermos um iniciado para termos capacidade de produzir este tipo de fenômeno. As manifestações do tipo chamado “poltergeist” são invariavelmente ativadas, ou pela proximidade de adolescentes sexualmente frustrados, ou de histéricos.

(5) Note-se a estrita semelhança com as lendas dos “zumbis” do Haiti.

(6) Isto é, entidades demoníacas materializadas sob aspecto humano.

(7) Lao-Tse. O autor do Clássico de Pureza, Ko Yuen, foi uma das encarnações de Aleister Crowley, que na época era discípulo do autor do Livro do Tao. Tanto o Livro do Tao quanto o clássico de Pureza serão eventualmente publicados nesta série, com notas do próprio Crowley.

(8) H. Campbell era um probacionista sob a orientação da Sra. Firth, “Dion Fortune”. O Sistema de Abramelin só deve ser utilizado por pessoas que alcançaram o Grau de Adepto Menor da A.’.A.’. ou seu equivalente em outros sistemas. Os talismãs são acionados por entidades demoníacas sobra as quais ninguém que não tenha alcançado o Conhecimento e a Conversação do Sagrado Anjo Guardião – isto é, a harmonização total de suas faculdades – poderá esperar obter controle.

(9) O ritual não era imperfeito; apenas, não era suficiente para banir o demônio encarregado de dinamizar o talismã. De qualquer forma, seria tolice da parte de H. Campbell banir uma entidade que ele acabara de invocar para executar um certo trabalho! Ele pegara um tigre pela cauda...

(10) Note-se o ego do aspirante, e sua total incompreensão do que é a legítima autoridade espiritual. O conhecimento o que ele tinha do Sistema de Abramelin era tão perfeito quanto pode ser o de um profano: o Sistema está aberta e claramente descrito.. O ritual utilizado não era imperfeito: era o utilizador do ritual que não tinha desenvolvimento suficiente para manter sob controle a força invocada. A palavra “combater”, empregada em relação ao demônio que estava encarregado de dinamizar o talismã, é particularmente tola. A atitude que ela sugere equivale a chamarmos um especialista para executar um determinado trabalho, e então desejarmos que o trabalho seja realizado sem que o especialista se apresente! Esta cegueira, infelizmente, é bastante comum em pessoas que se interessam por ocultismo: elas pensam que o trabalho mágico depende exclusivamente de quaisquer rituais. Tentar mandar nos espíritos sem termos envergadura moral para tanto, ou sem estarmos sob a fiscalização de alguém que a tenha, é – para dizer o mínimo – completa tolice. H. Campbell resolvera utilizar o Sistema de Abramelin sem o conhecimento nem o consentimento de sua instrutora, a qual sabia perfeitamente – sendo apenas Zeladora – que nem ela mesma estava em condições de utiliza-lo!

(11) Isto é, na Lua Nova seguinte.

(12) Os leitores não devem julgar que esta visão representava realmente a “aparência” do demônio encarregado de dinamizar o talismã. O imprudente aprendiz de feiticeiro formara um contato mágico com uma entidade de um certo plano, com a intenção de faze-la trabalhar para ele; mas como não tinha suficiente maturidade psíquica para controlar a força evocada, a energia desta impingira-se sobre ele, em vez de sobre o talismã, e começara a ativar as energias harmônicas consigo mesma dentro dos veículos do ser humano que a chamara. A visão foi uma formulação em termos inteligíveis do que estava acontecendo: uma parte das forças subconscientes (ou “subterrâneas”) do aspirante, até então entrelaçadas com outras nele mesmo apenas como receptoras-transmissoras, e portanto inócuas, estava se ativando de uma maneira anormal. O processo, se estiver sem controle central, é totalmente análogo à formação de um câncer no organismo físico.

Como quaisquer outras entidades dos planos sutis, os “demônios” não têm uma forma particular no senso em que nós, seres humanos encarnados, concebemos a idéia de “forma” (Rupa). Eles podem aparecer nas formas mais diversas, inclusive na de “anjos de luz”.

(13) Note-se a situação psicológica: o aspirante sentia que se acendesse um fósforo a ilusão se dissiparia (sinal de que associava, como é o caso de tantas pessoas ainda, a idéia de escuridão com a idéia de “mal”); mas não se atrevia a se mover, com medo de se cortar em estilhaços de vidro que ele sabia serem pura ilusão. É por isto que as práticas preliminares da A.’.A.’. (por exemplo) incluem cuidadoso treino nas técnicas de ioga, que conferem controle da mente.

(14) Nada havia de extraordinário nisto, mas era um sintoma perigoso: significava que a obsessão estava começando a se transmitir telepaticamente às pessoas relacionadas com ele. É assim que os “milagres” começam e se alastram.

(15) A “boa amiga” a quem ele se refere era a Sra. Firth, a qual também não estava qualificada para usar o Sistema de Abramelin, mas recorreu a George Cecil Jones em favor do seu aprendiz. O Adepto tomou sobre si a carga de força demoníaca que o discípulo da sua discípula ativara. A punição do imprudente consistiu em fazer essa confissão pública da sua estripulia.

(16) Esta faculdade do Magus se estende mesmo aos seus representantes e discípulos. Em certa ocasião, no antigo Largo da Carioca no Rio de Janeiro, entramos em conversa com um perfeito desconhecido sobre a situação política, pouco após a “revolução” de abril de 1964 e.v.. De repente ele nos olhou com uma expressão inteiramente nova no rosto e disse-nos, rindo: “Ah! Agora estou lhe reconhecendo!” Referia-se, é claro, ao nosso grau iniciático e à nossa função no país.

(17) Existe, definitivamente, uma relação entre os planos: a intensidade de energia física parece ser proporcional, dentro de certos limites, à energia astral, e viceversa; mas qualquer sistema de mensuração astral variará em relação aos fenômenos físicos. Em que proporção, e de que maneira, só poderá ser estabelecido por futuros pesquisadores que apliquem os métodos da Ciência ao propósito da Religião.

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