O Segundo Capítulo

Este artigo é um capítulo de Liber LXV vel Cordis Cincti Serpente Comentado por Aleister Crowley e Marcelo Ramos Motta

O Segundo Capítulo de Liber LXV comentado por Crowley & Motta.

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O Segundo Capítulo

O primeiro capítulo descreve o efeito produzido pelo Conhecimento e Conversação do Sagrado Anjo Guardião sobre a aparência das coisas e as sensações que essa aparência causa. É a transmutação do elemento Terra e da parte da alma que lhe corresponde, o Nephesch. Agora se trata do elemento Ar, as faculdades da alma chamadas Ruach, isto é, a mente considerada como um instrumento de apreensão intelectual, uma máquina apropriada para a análise de impressões e interpenetração destas em termos do pensamento consciente. O Trabalho de obtenção do Conhecimento e Conversação do Sagrado Anjo Guardião estando localizado em Tiphereth, o centro do Ruach, o resultado do sucesso é a harmonização, concentração e glorificação da mistura de ideias soltas e desconexas que são sugeridas pela multiplicidade sem significação das concepções mentais.

1. Eu entrei na montanha de lápis-lazúli, mesmo como um falcão verde entre os pilares de turquesa, sentado sobre o trono do Oriente.

Descreve a passagem da Consciência Divina (o Falcão) colorida por amor (verde) para dentro do mundo do espaço estelar (lápis-lazúli, pedra que é azul com pontos de ouro), seguindo um curso equilibrado desde a terra até o céu (os pilares da turquesa). O Oriente é o canto atribuído ao Ar, e o Falcão está ali sentado — isto é, estabilizado, não sendo distraído por quaisquer pensamentos que surgem na mente.

O Falcão aqui, contudo, não representa a Consciência Divina: é o Ser Mágico, que inclui todas as partes do complexo sthula-linga-prana-kama-manas que o Magista já tem sido capaz de “por em ordem”

2. Assim cheguei a Duant, a habitação das estrelas, e ouvi vozes que gritavam alto.

Estando agora aberta ao Universo inteiro, a Alma escuta o que quer que seja dito. (Ar é o veículo do som.)

Misturar metáforas com informações científicas objetivas é algumas vezes perigoso. O ar NÃO é o único veículo do som, e de qualquer forma, no simbolismo místico dos Elementos, audição é referida a Akasha. Nós podemos dizer, portanto, que aqui se fala de Akasha de Vayu, o Sub-Elemento do Elemento do Ar que é, por assim dizer, a Raiz dos Poderes do Ar. A mente — Manas — é referida ao Ar, assim como as emoções são referidas a Água. Mas claro pensamento e emoção no que eles interagem, partilham da natureza de ambos, e algumas vezes, mais Elementos. Deve ser sempre mantido em mente — se você perdoa o trocadilho — que este Capítulo se refere a Mente do ponto de vista do Espírito, isto é, do ponto de vista da Iniciação.

3. Ó Tu que sentas sobre a Terra! (Assim me falou certa Figura Velada) tu não és maior que tua mãe! Tu grão de pó infinitésimo! Tu és o Senhor de Glória, e o cão imundo.

Uma “Figura Velada” (Isis) explica que nenhuma consciência individual pode ser mais que a esfera de que nasce e que constitui o seu ambiente. É igualmente suprema e vil, estas qualidades sendo ilusões produzidas de relações artificiais, as quais podem ser escolhidas à vontade.

Podem ser escolhidas a vontade antes da encarnação, e mesmo então dentro de limites. Depois da encarnação, você está preso a suas limitações genéticas. Você pode fazer muito, como um Iniciado; mas você está limitado pela sua combinação de cromossomos herdada.

Esta é uma das muitas razões — todas elas egóicas, Nós asseguramos a você — porque Adeptos estão continuamente tentando aperfeiçoar a humanidade. O quanto mais saudável e sutil, mais combinações complexas são possíveis, maiores as chances de expansão. O Samadhi experimentado pelo cérebro de um Q.I. 75 não é o mesmo que o de um cérebro de Q.I. 300. Mesmo se acontecesse de ser o mesmo tipo de Samadhi. Você não pode fazer uma bolsa de seda de uma orelha de porca. Mas pode fabricar uma bela bolsa de coro de porco, se você for habilidoso, e o porco saudável o suficiente antes de morrer. Em resumo, você deve trabalhar com o material a sua disposição, você deve aceitar o fato que este material é basicamente um animal, e você nunca deve cometer o erro de negar ou mortificar ou restringir a besta em você. Você deve treina-la, não destruí-la!

4. Descendo, mergulhando minhas asas, eu cheguei às habitações de escuro esplendor. Lá, naquele abismo informe, fui eu feito um comungante dos Mistérios Invertidos.

A Divindade para se realizar a si própria, deve voluntariamente submeter-se à experiência de imperfeição. Deve tomar o Sacramento que a une ao escuro glamour do ‘Mal’, a contraparte do qual exalta o ‘Pecador’ à Divindade.

O conceito de Deus descendo a matéria afim de “redimir” é falso, conectado com o hiato psicológico entre Chesed e Binah. A fábula da queda foi inventada para explicar porque o homem é tão infortunadamente constituído (do ponto de vista dos homens preguiçosos, é claro), e para sustentar a Imagem do Pai a qualquer custo. Na realidade, o hiato é devido ao fato de que o homem é uma Entidade Espiritual vivificando o corpo e mente de um animal. Não há nenhuma conexão psicológica no cérebro entre as faculdades chamadas as Supernas pelos Cabalistas e as mais altas faculdades do homo saps: Chesed. Daath é, portanto uma construção artificial (novamente Ahamkara) com o objetivo de tornar possível a integração entre o Deus e o homem. Sua ineficiência é devida a sua mui recente aparição. Todas as faculdades relacionadas ao Alto Manas e ao Buddhi-Manas estão sujeitas a confusão e erro neste estágio da evolução, porque elas são novas, e permanecem em um estágio experimental. E as faculdades mais baixas, deixadas a si mesmas, funcionam bem do ponto de vista mundano: o homem (ou mulher) está feliz, satisfeito, próspero, e morto para vida superior. Tão logo as faculdades mais altas se tornam ativas, alegrias deste tipo desaparecem. O homem, não mais importa quão brilhante, prove incapaz de prover seu próprio sustento ou aquele de sua família; se torna “antissocial” e muito frequentemente termina na prisão ou no asilo. Em terra de cego, quem tem um olho é melhor correr se quiser salvar a vida. Cheque VII ii 27-33.

O objetivo é criar um tipo humano capaz de viver a vida superior enquanto ocupa um corpo de carne, e faze-lo sem problema, perturbação ou dor desnecessária. Este intento pode ainda levar algumas centenas de milhares de anos para Nós o levarmos a cabo, mas este é o Nosso programa, até então.

Por que então Deus vem a matéria? Para enriquecer a experiência Dele-Dela- Its. E este enriquecimento de experiência é basicamente um impulso egoísta. Nós não estamos tentando “salvar” o homem. Dane-se, Nós somos o homem. Sem Nós, há aqui somente o macaco e a criatura cega do lodo, como LXV mesmo tornará claro mais adiante.

5. Eu sofri o abraço mortal da Cobra e do Bode; eu prestei a homenagem infernal à vergonha de Khem.

Ela aceita a fórmula de: a) Dualidade, isto é, vida de vibração; (a-1) Morte; (a-2) a ilusão do Conhecimento. b) Exílio; (b-1) a Fome de Ardor; (b-2) Trabalho. Ela aquiesce à vergonha de ser um Deus oculto em forma animal.

6. Nisto havia esta virtude, que o Um tornou-se o todo.

O objetivo deste ato é realizar todas as possibilidades da nossa unidade através da representação de sua integridade como um número infinito de casos particulares, tal como alguém poderia tentar obter uma ideia do significado da palavra ‘poesia’ pelo estudo de todos os poemas existentes. Nenhum poema por si só poderia ser mais que uma ilustração imperfeita da ideia abstrata de ‘poesia’; no entanto, somente através dessas imagens concretas se pode alcançar alguma compreensão do que a palavra significa.

7. Além disto, eu tive a visão de um rio. Nele havia um botezinho; e neste, sob velas de púrpura, estava uma mulher dourada, uma imagem de Asi lavrada do ouro mais fino. Também, o rio era de sangue, e o bote de aço brilhante. Então eu a amei; e, desatando meu cinturão, atirei-me à correnteza.

7-16. O rio é a corrente de pensamento. O bote é o consciente. As velas de púrpura são as paixões que dirigem o curso do consciente, e a mulher é o ideal puro que procuramos fazer o ocupante constante e o guia da nossa vida consciente. Esta ‘mulher’, se bem que feita de ouro, é apenas um imagem sem vida. O rio é de sangue; isto é, a corrente dos pensamentos deve ser identificada com o objeto de nossa vida, não ser o mero campo de reflexão de toda impressão casual. O bote é de aço; isto é, a consciência deve ser capaz de resistir à intrusão de todo pensamento indesejado. Amando este ideal, o Aspirante se livra de tudo que o prende (vergonha, egoísmo, etc. — desatando o cinturão) e perde seu ego na corrente dos pensamentos (‘atirei-me à correnteza’).

8. Eu recolhi-me ao botezinho, e durante muitos dias e noites eu a amei, queimando lindo incenso diante dela.

Ele se identifica com o consciente puro, imune ao curso do Pensamento, no entanto flutuando nesse curso, e se devota a este Ideal, com fervor poético e religioso.

9. Sim! Eu lhe dei a flor da minha juventude.

Ele consagra a sua energia criadora ao Ideal.

10. Mas ela não se moveu; apenas, pelos meus beijos eu a conspurquei tanto que ela enegreceu perante mim.

Este processo destrói a beleza superficial do Ideal. Sua pureza é corrompida pelo contato da mortalidade.

11. Entretanto eu a adorei, e dei-lhe a flor da minha juventude.

A despeito do seu desapontamento, o Aspirante persiste em ‘amor sob vontade’. Ele se dá completamente à Verdade, mesmo agora quando ela parece tão escura e medonha.

12. Também aconteceu que através disto ela adoeceu, e corrompeu-se diante de mim. Quase eu me atirei à correnteza.

O Ideal agora se decompõe em formas repulsivas, não mais reconhecíveis como o objeto do amor dele. O Aspirante é tentado a abandoná-la, e a buscar refúgio do Consciente afogando-se nesses pensamentos que o rodeiam, e que continuamente tentam a atenção dele.

13. Então, no fim marcado, seu corpo era mais branco que o leite das estrelas, e sua boca rubra e quente como o acaso, e sua vida de um branco em brasa como o calor do sol do meio-dia.

Esse desespero subitamente se desfaz. Seu ideal aparece em sua verdadeira forma, uma mulher vivente em vez de uma imagem de ouro inanimada. A substância dela é agora mais pura que a luz das estrelas; seus lábios — o instrumento de sua fala e das suas carícias — são cheios de vida e calor como o ocaso — isto é, eles prometem repouso, amor e Beleza (Hathor, deusa do Oeste) . Ela está viva com a pura energia do centro do sistema ao qual o Aspirante pertence: isto é, ela é a realização da ideia criadora de que até agora ele havia sido apenas parte.

14. Então ela se ergueu do abismo de Idades de Sono, e seu corpo me abraçou. Eu me derreti por completo em sua beleza, e alegrei-me.

A escuridão do passado desaparece quando seu Ideal possui o Aspirante; e seu Ego se dissolve no êxtase de união com ela; ele se torna a essência de toda a Alegria.

15. Também o rio tornou-se o rio de Amrit, e o botezinho era a carruagem de carne, e suas velas o sangue do coração que me carrega, que me carrega.

Agora então mesmo os pensamentos do Aspirante se tornam imortais; sua consciência é compreendida como veículo da sua vida física — em vez de vice-versa, como se supõem os profanos. Suas paixões já não são sintomas de descontentamento, mas idênticas com a vida individual dele. Assim, não há conflito com a Natureza. A Vontade é ela mesma o Ente.

Esta é certamente uma descrição de Integração, ou Iniciação. Também, o barco é o barco de madrepérola descrito no capítulo 1; contudo, toda a operação é vista de um plano, e conforme outra possível fórmula de Realização — não aquela do Salvador-Adepto, claro.

Em cada aeon há um Adepto que é escolhido para ser o Cristo do Aeon. Neste aeon, ele é o ΤΟ ΜΕΓΑ ΘΗΡΙΟΝ, 666, que foi encarnado como Aleister Crowley. A escolha é kármica, isto quer dizer, cósmica. O Adepto é escolhido porque o complexo de energias que ele representa, harmoniza melhor com o complexo de energias cósmica que provê a corrente mágica do aeon. Ele é, naturalmente, o Magus do Aeon.

16. Ó mulher serpente das estrelas! Eu, mesmo eu, Te fiz de uma pálida imagem de ouro fino.

Minha concepção pessoal de Nuit é o resultado da Operação de Magia que eu executei para dar vida ao ideal que originalmente eu tinha em meu coração, adorei, e resolvi realizar. A passagem inteira descreve a maneira de se lidar com qualquer ideia de forma a realizá-la em perfeição.

17. Também o Santo veio sobre mim, e eu vi um cisne branco flutuando no azul.

O cisne é a Consciência extática do Adepto. Está pousada no espaço infinito, suportado pelo Ar — i.e., o campo de propagação do pensamento.

“O Santo veio sobre mim” é uma expressão com duplo significado. Em um senso ela significa, “Eu fui tomado em samadhi”. Em outro senso ela significa que a consciência do Anjo, ou guru (um caso mais baixo, mas a expressão é comum no misticismo Hindu), envolveu o Adepto, ou o chela, desse modo estimulando a mente inferior à percepção espiritual. O efeito deste “eclipsar” depende inteiramente de nível de desenvolvimento do eclipsado. o quanto mais desperto voc6e está, mais ampla a experiência resultante da interpenetração de sua aura pela aura do Anjo. Veja Liber Samekh e o Escólio ali.

Também, não interprete mal a expressão “eclipsado”. Não é hipnotismo ou dominação ou possessão, mas antes um fenômeno semelhante a ressonância, na qual , se um violino vibra perto de outro, as cordas do outro instrumento tenderá a vibrar também.

18. Entre suas asas eu me sentei, e os aeons fugiram.

No Êxtase, o tempo não conta.

Melhor dizer que o tempo corre em uma razão diferente de velocidade. Ele conta, mas de acordo com outra fórmula.

19. Então o cisne voou, e mergulhou, e subiu; no entanto não fomos alhures.

O Êxtase move-se de uma sublimidade de Dita a outra; mas não há progresso possível para a perfeição, portanto não existe fito a ser alcançado em tais movimentos.

Novamente, este estado não é “perfeição”. Perfeição é um limite para o qual nós tendemos, mas o dia que nós acreditarmos que o alcançamos nós estaremos mortos. Daí o Fausto e Mefistófeles de Goethe.

20. Um meninote louco que montava comigo falou ao cisne e disse:

O meninote é a razão humana, que exige mensuração como condição primária de consciência inteligível. Sabendo que o tempo está passando, ele não pode compreender por que este movimento todo não acercou o cisne de algum ponto fixo, ou por que a relação entre o ponto de partida e a presente posição do cisne não é um constante motivo de ansiedade para este. O meninote não pode compreender movimento sem referências a coordenadas fixas.

O ponto mais interessante desta descrição da razão humana como “um meninote louco”. Nós temos, portanto, uma faculdade que é muito jovem e que não tem ainda se harmonizado completamente.

21. Quem és tu que flutuas e voas e mergulhas e sobes no inano? Vê, todos estes aeons passaram; de onde vens tu? Aonde vais?

22. E rindo, eu lhe ralhei, dizendo: Não há de onde! Não há onde!

Eu respondo que, apreendendo o contínuo (Nuit) como tal, não existem “marcas-no-espaço”.

É a maior tolice perguntar onde o Universo começou e onde ele terminará, ou perguntar quem criou tudo. Nós somos criaturas mortais, isto é, criaturas de vibração, e nós percebemos o universo externo através de nosso instrumento de percepção, que é viciado pelas próprias limitações. Por que deveriam as coisas terem que ser criadas? Por que deveriam elas ter que ter um começo e um fim? Na verdade, a energia que nos anima em nosso curto rastejamento sobre a superfície deste planeta (ou nossos saltos ocasionais fora dele) não é afetada pela transmutação de nossa carne. Ela existia antes, e continuará existir depois que nós não mais existir. Para nós há onde e aonde, mas se existe o mesmo para ela, será de acordo com outro parâmetro. Todas as coisas estão, e sempre estiveram, mudando. Não há nenhuma “razão” para pensar que elas não continuarão a mudar. Teorias tais como entropia são meras extrapolações de nosso próprio senso de limitação. Na verdade, cientistas estão começando a suspeitar que matéria está continuamente sendo e morrendo por todo o universo. Precisamente como os seres humanos, para não dizer todas as formas de vida.

23. O cisne não falando, ele respondeu: Então, se não há fito, para que esta jornada eterna?

O cisne, naturalmente, permanece em silêncio: o Êxtase transcende a expressão. A razão pergunta o motivo de movimento sem destino.

O cisne tem sempre sido, no Oriente, um símbolo de samadhi. Daí o título místico de Paramahansa — o Cisne Transcendental, isto é, o místico que conquistou Samadhi perfeitamente.

24. E eu reclinei minha cabeça contra a Cabeça do Cisne, e ri-me, dizendo: Não há alegria inefável neste voo sem fito? Não há cansaço e impaciência para quem quereria alcançar algum alvo?

O Adepto aproximando seu pensamento ainda mais do Êxtase, ri, tanto de pura alegria quanto porque acha graça na absurda incongruidade de argumentos “razoáveis” dos quais ele agora está agora livre para sempre; e expressa sua ideia assim: O livre exercício de nossas faculdades é pura alegria; se eu sentisse necessidade de alcançar algum objetivo, isto resultaria na dor do desejo, na tenção do esforço, e no medo de fracasso.

Deve ser compreendido que os planos não devem ser misturados. No plano que nós normalmente vivemos, aquele na verdade onde o “meninote louco” tem domínio, a dor do desejo, a tensão do esforço e medo de falha são estados normais do kama da mente. É a percepção de que eles são relativos, e não absolutos, que produz no Iniciado aquele estranho (estranho à humanidade normal, deve ser entendido) desapego que faz com que eles algumas vezes riam em situações onde outros homens podem chorar. Todavia nós devemos agir, neste plano do “meninote louco”, de acordo com as regras do jogo, se nós queremos ‘ganhar’ neste plano. Isto é também o que se queria dizer pela antiga injunção ‘Rosa-Cruz’ que os irmãos deveriam adotar as roupas e os costumes dos países em que eles por ventura estivessem viajando em qualquer época.

25. E o cisne permaneceu silente. Ah! mas nós flutuamos no infinito Abismo. Alegria! Alegria! Cisne branco, sustenta-me sempre entre tuas asas!

O Êxtase permanece imperturbado. Mas o diálogo fez com que o Adepto refletisse mais abertamente sobre a sua dita, de forma que o Êxtase se torna imóvel, percebendo sua perfeita relação com a Infinidade do contínuo.

O Adepto requer que o êxtase seja constante.

26. Ó silêncio! Ó êxtase! Ó fim das coisas visíveis e invisíveis! Tudo isto é meu, que Não sou.

Silêncio dá termo à imperfeição implícita na linguagem humana — todas as palavras sendo evidência de dualidade, uma quebra na Perfeição. Êxtase: fim do conflito entre quaisquer duas coisas: elas são dissolvidas por Amor; e perdendo o senso do Ego que causa a dor do sentimento de sua separação do Todo, sua imperfeição, a dissolução do esforço é expressada como êxtase. ‘Ó fim das coisas visíveis e invisíveis!’ Isto não só significa que todas as coisas — sendo imperfeitas — são destruídas, mas que este é o verdadeiro fim — τέλος — das coisas — sua perfeição. ‘Tudo isto é meu, que Não sou.’ O Adepto é agora proprietário de todas as coisas, tendo chegado ao estado chamado ‘Não’ que contém todas elas, e do qual elas são somente imagens. Enquanto ele era um Ego positivo, ele era uma delas, e oposto a elas; elas não lhe pertenciam. Para fazê-las suas, ele deve tornar-se contínuo em que todas as coisas existem potencialmente como membros de qualquer série que seja selecionada para ilustrar quaisquer propriedades da Natureza.

O estado de ‘Não’ pode também ser definido como as Núpcias de Nuit e Hadit, ou o acordar e integração de Ajna e Sahashara.

27. Deus Radiante! Deixa que eu faça uma imagem de ouro e gemas para Ti! para que o povo possa derrubá-la e espezinhá-la em pó! Para que a Tua glória seja vista deles.

O Adepto é movido a manifestar sob a forma de poesia a Divindade que ele viu. Ele prevê que o vulgo se enfurecerá aos pés; mas assim fazendo, pelo ato mesmo os olhos deles se abrirão à glória do Deus. Isto pode significar que o meu Trabalho pode vir a renovar o verdadeiro fervor religioso nesses que perderam toda visão e toda fé; sua fúria contra mim os levará a perceber que no fundo dos seus corações está o instinto de que eles são entes espirituais.

‘Para que a tua Glória seja vista deles’ é uma frase tão desajeitadamente construída que pode ser interpretada como “Para que eles possam perceber que a glória que eles veem é a deles próprios.” Isto obviamente é de propósito.

Quando quer que um homem diz “Eu sou Deus” ele desperta a indignação de seus semelhantes. Eles não compreendem que esta indignação vem do fato que se ele adoram um Deus ou não, substancialmente eles identificam a natureza mais íntima deles com a divindade. A indignação na verdade significa: “Não seu filho da puta, você não pode ser Deus, porque Eu é que sou”. Os Adeptos são portanto usualmente prudentes o suficiente para não declarar as suas divindades. Friedrich Nietzsche, que alcançou Tiphereth somente através de seu gênio, infelizmente não tinha suficiente treino mágico para ser discreto, e andou agindo e falando como a encarnação de Dionísio que ele era. Como uma consequência ele terminou seus dias em asilo de insanos. O mesmo tipo de fato deparou-se com Ezra Pound e Wilhelm Reich entre outros. Que tais homens foram mandados para asilo de insanos não os condenam, mas envergonha a sociedade em que eles viveram. Tribos antigas, estando mais próximas da natureza, respeitam os loucos e dizem, corretamente, que eles estão “possuídos pelos Deuses”. Deixados estritamente sozinhos, e tratados com gentileza e respeito, pessoas passando por trances místicos deste tipo, irão gradualmente equilibrar seus mergulhos nos planos de consciência e alcançar um estado de integração muito mais amplo que aquele que eles tinham antes, assim enriquecendo a vida da sociedade deles. Na verdade, isto é verdadeiro para a maioria dos distúrbios psicológicos. Insanidade sem esperança pode ser o resultado de ir através de um despertar espiritual entre pessoas “normais” que são, em sua maioria, totalmente insanos (‘um meninote louco’) tanto quanto imaturos do ponto de vista das Supernas.

28. Nem será dito nos mercados que eu cheguei quem deveria vir; mas Tua vinda será a Palavra única.

Meu trabalho religioso não resultará em eu ser reconhecido como o redentor; mas os homens admitirão que o Espírito do Deus Solar Hórus soprou sobre eles, e infundiu-lhes a vida.

“Deus Radiante” é, claro, em qualquer aeon, o Deus ou Deusa entronado ou entronada no assento de Ra, e aqui nós estamos tratando dos problemas de Hierarquia. Em qualquer aeon há o vice-rei de Ra, um ministro de HoorpaKraath (isto é, um Hierofante do Magi) e o Magus do aeon (algumas vezes há mais que um, apesar de não ser este o caso no presente aeon) , que é o Hierofante dos Mestre do Templo. Nós estamos, certamente, usando termos thelêmicos e lidando com classificação thelêmica.

Therion é um Adepto de tal elevada ordem que Ele não está nem ó mínimo interessado em ser conhecido como Redentor: ele quer que a humanidade experimente contato direto com o Supremo Hierofante, Heru-ra-ha neste aeon. Θελημα veio para erguer a raça humana a um grau até agora não sonhado de civilização e progresso espiritual. Portanto ele limita-se em ser simplesmente um Canal por onde a consciência normal possa entrar em contato com aquela Força Radiante do Sol Espiritual. (O vice-rei, claro, estimula a consciência de Kether.)

29. Tu Te manifestarás no imanifesto; nos lugares secretos os homens te encontrarão, e Tu os conquistarás.

Hórus será reconhecido como a explicação de todas essas energias do Universo que nós sabemos devem existir, se bem que nossos sentidos não podem percebe-las. Os homens perceberão Hórus ao explorarem os mistérios da Natureza, como o inconsciente no Homem, ou a estrutura do Átomo. Ele os compelirá a admitir que Ele é o Ultimal princípio atrás de todas as manifestações, contrariando as velhas teorias deles. (O exato significado de ‘Hórus’ nesta passagem deve ser extraído de CCXX, Capítulo III.)

Nós estamos indo um pouco longe demais aqui. Hórus não é o ultimal principio básico de toda manifestação: este princípio é Nuit. Contudo, por causa de sua posição como Consciência de Kether; Ele levará cientistas e artistas a uma maior percepção do Universo — uma percepção que será naturalmente matizada pelo complexo de energias que forma o presente Aeon de Aquário-Leo, e matizada pela Natureza do Deus mesmo. Ele é, em si mesmo, uma Estrela — gigante em comparação a humanidade normal, um Impíssimo da mais alta ordem. Ele é, também, o Monarca Absoluto de Iniciação neste Aeon. Opor-se a Ele é falha ultimal, e desobedecer ou desrespeita-Lo é fatal. Isto é devido ao enorme potencial de energia concentrado em volta de Sua obra, da qual Ele é o centro e o ponto de balanço. Ir contra ele é perder a si mesmo em turbilhão de forças que vão a lugar nenhum e que o arrasará. E no entanto — como ousam eles que ousam sua lança neste Escudo! O Deus ri de Seu Êxtase, e prova a si mesmo. AL i 28-30.

‘Os lugares secretos’ — os lugares mais íntimos e secretos de suas próprias almas, que eles pensaram ser segura de ser examinada mesmo por sua própria consciência normal.

30. Eu vi um jovem pálido e triste deitado sobre o mármore à luz do sol, chorando. A seu lado estava o alaúde esquecido. Ah! mas ele chorava.

30-36: O Jovem é Ganimedes, a águia, a ave de Júpiter. Aqui, ele é uma imagem do Adepto.

Ele é pálido, tendo dado o seu sangue ao seu Trabalho. Ele é triste, tendo compreendido a Dor do Universo (Seu próprio Trabalho o levou a esta compreensão). Ele está deitado, como que cansado e duvidando se vale a pena trabalhar. Ele está sobre o mármore; isto é, os duros, nus fatos da existência, apensar de todo o polimento, machucam lhe a carne. Ele está à luz do sol: ele vê mais que claramente a Natureza. Seu Anjo brilha sobre ele, mas de uma altura inacessível. Ele chora: ele cujo dever é verter vinho para os Deuses, pode apenas derramar água salgada sobre o solo nu. Ele pôs de lado e até esqueceu o seu alaúde. Ele não pode fazer música; até perdeu a memória de que era capaz de fazê-lo antigamente.

31. Então veio uma águia do abismo de glória e cobriu-o com sua sombra. Tão negra era a sombra que ele ficou invisível.

A Águia simboliza a influência do Pai dos Deuses, também a mais alta forma de Vida Mágica, e o Governo do Ar, isto é, o poder de comandar o mundo dos pensamentos. Isto o cobre de maneira a esconder a personalidade dele.

O Falcão, o Cisne e a Águia são símbolos cognatos do Ar, mas cada um com um tipo diferente de função. Cheque O Coração do Mestre e a fórmula mágica correspondente a estes pássaros. A cada um também corresponde um tipo de samadhi.

32. Mas eu ouvi o alaúde tocando vivamente através do ar azul e quieto.

Assim inspirado, ele retoma alegremente a sua música; o Ar mesmo torna-se quieto, isto é, nenhum pensamento o perturba; e é azul, estando cheio dos espíritos de santidade, amor e pureza.

33. Ah! mensageiro do Bem-Amado, cobre-me com a Tua sombra!

O Adepto invoca a Palavra de seu Anjo para silenciar todos os pensamentos pessoais.

Não para silencia-los: para harmoniza-los, isto é, para organizar sua vida humana do ponto de vista do Espírito.

34. Teu nome é Morte, talvez; ou Vergonha, ou Amor. Contando que me tragas novas do Bem-Amado, não perguntarei teu nome.

Ele aceitará isto em qualquer forma em que apareça; se a Morte mesma for necessária para acabar com a amolação do Ego, ou a Vergonha para mortificá-lo e impedir que se apavoneie, ou o Amor para destruir as suas ambições, ainda assim o Adepto aceitará o mensageiro.

Está é a atitude equivalente do Mestre do Templo, que jura interpretar todo fenômeno como um trato particular entre Deus e sua alma. Oswald Spengler colocou isto em termos mais apreensível pela intelectualização abstrata quando ele disse: “Tudo de que nós estamos cônscios... tem para nós um profundo significado imóvel, um significado final. E o um e único meio de proporcionar este incompreensível compreensível deve ser um tipo de metafísica que considera tudo que seja como tendo significado como um símbolo”.

35. Onde está agora Mestre? gritam os loucos meninotes. Ele está morto! Ele está envergonhado! Ele está casado! e sua zombaria dará volta ao mundo.

Seus preconceitos ‘racionais’ presumivelmente perguntarão em tal caso: “Que aconteceu com as tuas ambições mágicas? Tu não és o Mestre que querias ser; tu és apenas o escravo desse teu Anjo — o que quer que a palavra signifique. Tua personalidade está sufocada, tuas ambições estão esmagadas, tua ocupação única é ecoar as palavras desse ‘Anjo’, as quais tu nem sequer aprovas”.

“Tu destruístes teu Ser, tu mereceste inventivas dos teus amigos: tu abandonaste sua carreira e te ataste aos caprichos de uma mulher.”

Não são apenas os preconceitos racionais que falarão com ele assim; os “loucos meninotes” indicam todas as mentes normais em volta dele, ecoada na ou ecoando a sua própria.

36. Mas o Mestre terá tido a sua recompensa. O riso dos zombadores será um corrupio no cabelo do Bem-Amado.

O Adepto admite que seu corpo e mente, abandonados a sua sorte, sofreram esses desastres. Mas a intimidade com seu Anjo, para adquirir a qual ele deliberadamente abandonou todo cuidado com seus assuntos pessoais, justifica a sua conduta; e as recriminações de suas ideias intelectuais não são por ele percebidas como tais: elas são para ele um movimento do cabelo do Bem-Amado (energias radiantes da Individualidade do Anjo) ; isto é, elas chamam sua atenção para uma das Glórias d’Aquele.

Se fosse somente isto, nós estaríamos restringidos a aceitar que a relação Adepto-Anjo é uma de pura escravidão e vampirismo. A verdade é para se encontrada no Capítulo I, 41-46 e os Comentários ali. O que o Adepto está tentando alcançar está além do alcance dos ‘loucos meninotes’. Para eles ele é um tolo carregando um saco vazio e assaltado por bestas selvagens, de nariz torcido para futilidades e um abismo abrindo a seus pés. No entanto este é o Tolo do Taro, a primeira Emanação de Kether, o Perfeito. Veja AL i 45.

Uma vez a Obra tenha sido realizada, contudo, o Adepto deve — se ele ainda tem tempo disponível naquela existência particular — consolidar seus ganhos nos planos mais baixos também. Veja AL ii 24.

37. Vê! o Abismo da Grande Profundeza. Ali está um pujante golfinho, fustigando seus lados com a força das ondas.

37-44: Esta passagem é uma parábola com diversas aplicações.

I. Descreve a maneira de adquirir Concentração pelo método das ‘Escadas’ (ver Liber Aleph) .

II. Indica como lidar com gente que desejamos iniciar.

III. Dá um método para se passar de um estado mental a outro à Vontade.

A ideia básica é que em cada caso é que devemos aplicar o remédio apropriado a qualquer doença que possa existir; não algum remédio idealmente perfeito. A matéria prima deve ser passada gradativamente através de cada fase do processo; é inútil tentar obter dela a Tintura Perfeita através da execução imediata da Projeção Final.

IV. Descreve o curso inteiro do Caminho Iniciático.

Estes quatro significados necessitam uma explicação detalhada, verso por verso.

I. O Abismo é a Mente; o Golfinho é o Consciente Desassossegado.

II. Os homens são governados pelo orgulho e outras paixões.

III. O golfinho significa qualquer estado mental que seja inquieto, descontente e incapaz de escapar às suas circunstâncias.

IV. O golfinho é o profano.

38. Ali está também um harpista de ouro, tocando infinitas melodias.

I. O harpista é o instrutor cujo elogio do Caminho Iniciático induz o profano a procurar a Iniciação; ele é o Guru que aquieta a mente fazendo-a escutar sons harmoniosos, em vez de torturar-se pensando em suas dores e suas paixões. Estes sons harmoniosos são produzidos através de meios mecânicos; isto refere-se a práticas como Asana, etc.

II. Eles são mais eficientemente impressionados pelo elogio da beleza, mostrada em suas mais brilhantes vestes.

III. Cura isto refletindo que esta é a matéria prima da Beleza, tal como o caráter de Macbeth, o infortúnio de Timon, etc., deram a Shakespeare sua chance. Faz com que teu próprio problema sirva ao tema de tua vida como um sublime drama.

IV. Percebendo o seu mal estado, e deleitando-se nos prospectos que a iniciação oferece, ele (39) renuncia a tudo e se torna um Aspirante puro.

39. Então o golfinho deleitou-se nelas, e deixou seu corpo, e se tornou uma ave.

I. Libertado de sua grosseria e violência, o Consciente aspira a ideais elevados. É, no entanto, incapaz de manter silêncio e tem inteligência. É treinado escutando a harmonia da vida — alento inspirando junco, em vez de músculo agitando metal; isto refere-se a Pranayama, mas também à apreensão de que a inspiração em si é apenas um movimento superficial; o Consciente deve aprender a arte de usar todo e qualquer alento para produzir harmonia.

II. 39-40. Quando tiverem sido ensinados a aspirar, e tiverem sido limpos dos apetites mais grosseiros, ensina-lhes as sete ciências.

III. Desta forma, teu pensamento se tornará lírico; mas isto não será suficiente para satisfazer tua necessidade. Tu sentirás a natureza transitória de tal pensamento.

40. O harpista também pôs de lado sua harpa, e tocou melodias infinitas na Flauta de Pan.

I. 40-41. O Consciente agora adquire agora compleição divina e humana.

III. Transforma-o apreciando-o como um fato de intrínseca importância na estrutura do Universo.

IV. Ele aprende que o Adepto não é uma perfeição daquilo que ele sente ser a parte mais nobre dele mesmo, mas um Microcosmo.

Esta é uma das diferenças fundamentais entre o verdadeiro Adepto e um Irmão Negro.

41. Então a ave desejou muito esta alegria, e depondo suas asas, tornou-se um fauno da floresta.

I. O Fauno simboliza a aspiração firme, o poder criador e a inteligência humana. As asas do anseio idealístico são depostas; o pensamento aceita o fato de sua verdadeira natureza e aspira apenas a perfeições possíveis.

II. 41-42. Tendo-os instruído até eles estarem realmente prontos, por estarem completos, para real iniciação, dize-lhes Verdades.

III. A exaltação lírica dará lugar a uma realização profunda de ti mesmo, e de tudo que te concerne, como um Habitante da Natureza, contendo em tua consciência os elementos do Bestial e do Divino, ambos igualmente necessários à Compleição do Universo. Teu desconforto mental do início agora te parecerá agradável, uma vez que sem aquela experiência tu serias eternamente mais pobre.

IV. Ele completa a formação de si mesmo como uma imagem do Todo.

42. O harpista também depôs sua flauta de Pan, e com voz humana cantou suas melodias infinitas.

I. Agora ele ouve a harmonia do Universo expressada através da voz humana; isto é, sob uma forma articulada e inteligível, de maneira que cada vibração, além de deleitar os sentidos, apela à alma. Isto representa o estágio da concentração em que, estando fixo em meditação sobre algum assunto, o praticante penetra no aspecto superficial deste e tenta atingir-lhe a realidade, o verdadeiro significado de sua relação com o observador.

III. Agora interpreta aquela experiência como ‘um trato de Deus com tua alma’. Descobre uma explicação articulada para ela; compele a experiência a fornecer uma mensagem inteligível.

IV. 42-43. Ele então compreende todas as coisas, e finalmente se torna o Todo.

43. Então o fauno encantou-se, e foi-lhe atrás muito longe; por fim o harpista calou-se, e o fauno virou Pan no meio da primal floresta da Eternidade.

I. O estágio final é alcançado. Todos os positivos possíveis são percebidos como desvios do Negativo, e portanto como erros. Há Silêncio. Então o Fauno se torna o Todo. Foi-se a floresta limitada das ideias secundárias em que no passado ele habitou, e que ele abandonou para seguir a Palavra que o encantou. Ele está agora no Mundo de Ideias cuja natureza é simples (primal) e que não são determinadas por condições tais como o Tempo. (Uma árvore é uma ideia, sendo fálica e tendo ramos.)

II. Uma vez eles estejam no Caminho, cala-te; eles chegarão à Consecução naturalmente.

III. Continua este fio de pensamento até entrares em Êxtase, causada pelo reconhecimento do fato que tu — e tudo mais — são expressões extáticas de um sublime Orgasmo Espiritual, elementos de uma Eucarística oniforme. A Verdade, não importa quão esplêndida, perderá agora todo significado para ti. Ela pertence a um mundo onde descriminação entre sujeito e predicado é possível, o que implica imperfeição; e tu te elevaste acima desse plano. Tu assim te tornas Pan, o Todo; não mais uma parte. Tu vibras com a alegria do ardor de criação, tornada uma deusa virgem por amor a ti. Também, tu estás louco, a razão sendo o estado que conserva as coisas em proporção definidas umas com as outras, enquanto que tu as dissolveste todas em teu próprio ser, em êxtase incomensurável.

44. Tu não podes encantar o golfinho com silêncio, Ó meu profeta!

I. Pratica Yoga Elementar até tua técnica ser perfeita; não tentes atingir Nibbana até saberes como!

II. Muitas são as virtudes do Silêncio; mas quem jurou auxiliar aos homens tem que ensinar-lhes o Próximo Passo.

III. Não tentes curar ataques de melancolia através de ideais elevados; eles parecerão absurdos, e tu apenas aumentarás teu desespero.

O profano não consegue imaginar qual a intenção dos Mestres quando estes trabalham com os que lhe estão mais próximos.

45. Então o Adepto foi arrebatado em dita, e o além da dita, e excedeu o excesso do excesso.

45-49. Esta passagem descreve a reação do Adepto ao estado de Êxtase. O ponto é, que toda tentativa de descrição é fútil.

45. Frases extravagantes tentam registrar o Evento.

Não tão extravagantes: eles intimam beatitude, e então transcendência dos limites normais da consciência a outro estado onde parâmetros não podem ser encontrados.

46. Também seu corpo tremeu e cambaleou com a carga daquela dita, e daquele excesso, e daquele ultimal inominável.

O corpo físico, seus nervos (ao tentarem reagir simpaticamente à experiência) sendo carregados além de sua capacidade, é atingido.

Está é uma das razões porque o Aspirante é frequentemente estimulado a aumentar a força e saúde de seu corpo físico. Veja a Tarefa dos Graus, e AL, II 70.

47. Eles gritaram Ele está ébrio ou Ele está louco ou Ele sente dor ou Ele está a ponto de morte; e ele não os ouviu.

O observador (outros, ou a própria mente racional dele) não compreende o que se passa.

Por favor, note o E maiúsculo e o e minúsculo no verso. Estas variações são sempre muito importantes e significativas nas publicações em Classe A.

48. Ó meu Senhor, meu bem-amado! Como hei de compor cantos, quando até a memória da sombra da tua glória é uma coisa além de toda música da fala ou do silêncio?

Tudo isto é inexprimível.

49. Vê! eu sou um homem. Mesmo uma criancinha poderia não Te suportar. E então!

Mesmo a inocência de uma criança não poderia suportar o impacto do Anjo. Um homem, tendo ideias fixas da verdade, sofre um terrível abalo quando elas são todas despedaçadas, tal como acontece nesta experiência.

50. Eu estava só num grande parque, e junto a um certo outeiro estava um anel de relva profunda esmaltada onde uns vestidos de verde, lindíssimos, brincavam.

50-52: O parque é o mundo das ideias bem plantadas e bem cultivadas, tais como o literato e o letrado usufruem. Aqui eu encontrei um lugar onde eu podia exaltar minha consciência (o outeiro). Perto estava um anel de relva (minha poesia) em que brincavam fadas (meus personagens, minhas frases, meu ritmo, etc.).

51. Em seu brinquedo eu cheguei até mesmo à terra do Sono Encantado. Todos os meus pensamentos estavam vestidos de verde; lindíssimos eram eles.

Brincando assim, eu cheguei a um estado de êxtase poético (Sono Encantado). Aí eu me senti feliz.

52. A noite inteira eles dançaram e cantaram; mas Tu és a manhã, Ó meu querido, minha serpente que Te enroscas em redor deste coração.

Mas isto tudo aconteceu durante a noite; meu mais elevado êxtase poético é como escuridão comparado à luz do Conhecimento e Conversação do Sagrado Anjo Guardião.

53. Eu sou o coração, e Tu a serpente. Aperta mais teus anéis em volta minha, para que nem luz nem dita possam penetrar.

Eu sou o senso feminino que aceita os abraços do masculino S.A.G. Eu requeiro contato mais íntimo: mesmo a luz e a dita do Êxtase me distraem da União com Ele.

54. Arrebenta-me em sangue, como uma uva sobre a língua de uma branca jovem Dórica que enlanguesce ao luar com seu amante.

Sua presença não deve me deixar nenhuma luz própria.

Os leitores devem considerar a justaposição de sangue, uva e jovem como uma metáfora poética, e ela pode ser considerada assim; embora, ela também possa ser a unificação de várias memórias em uma ‘onda de Seu cabelo’. Este é um assunto difícil e cautela nos leva a não encorajar os excessivamente imaginativos a discorrer longamente nele no presente. Nós referimos os estudantes sérios a LXV i 33-40, LXV ii 30-33, LXV iii 40-46, LXV iv 7, LXV v 47 e os Comentários ali.

55. Então que o Fim desperte. Longo tempo tu dormiste, Ó grande Deus de Terminus! Longamente tu esperaste no fim da cidade e das estradas desta. Acorda Tu! não esperes mais!

O Fim significa “O Verdadeiro Ser”. Terminus é a Pedra Fálica que jaz além da mente (cidade) e seus pensamentos (estradas) . Através desta União com o Anjo eu espero chegar ao Verdadeiro Ser, o eterno, fixo indivíduo criador.

Esta “fixidez” é certamente em relação à Ponta Polida, centro do complexo de energias chamado ‘estrela’.

56. Não, Senhor! mas eu cheguei a Ti. Sou eu que espero enfim.

Tendo conseguido o Conhecimento e Conversação do Sagrado Anjo Guardião (por um esforço, por assim dizer, masculino) o Adepto torna-se receptivo, feminino, paciente, entregando sua vontade por completo àquela do seu Anjo.

O resultado desta entrega é o despertar da Verdadeira Vontade. Veja AL i 61, e os parágrafos correspondentes em Liber NV. Seria possível explicar intelectualmente este aparente paradoxo, mas nós preferimos lembrar a imagem do violino ressoante. O Anjo está fazendo Sua Vontade; a entrega do Adepto lhe impele na direção de sua própria verdadeira órbita. Veja AL i 45-48 e os Comentários ali.

57. O profeta gritou contra a montanha: vem tu aqui, para que eu possa falar-te!

57-60: É igualmente inútil chamar o que a gente deseja ou sair à sua procura. Isto apenas afirma a ausência da coisa desejada, e a verdade é que está com a gente o tempo todo, se apenas extinguimos a nossa inquietação.

58. A montanha não se moveu. Portanto foi o profeta até a montanha e falou-lhe. Mas os pés do profeta ficaram cansados, e a montanha não lhe ouviu a voz.

59. Mas eu clamei alto por Ti, e viajei em busca Tua, e de nada me valeu.

60. Esperei com paciência, e Tu estavas comigo desde o início.

61. Isto agora eu sei, Ó meu amado, e nós estamos deitados à vontade entre os vinhais.

Isso feito, acabou-se o esforço; temos apenas que usufruir.

62. Mas antes teus profetas; eles devem gritar alto e fustigar-se; eles devem cruzar desertos virgens e oceanos insondados; esperar por Ti é o fim, não o princípio.

Porém, tal como as coisas são, nós somos constituídos de maneira a ser incapazes de tal simplicidade. Temos que passar por muito para aprendermos a esperar!

O problema surge do fato que a mente — que, a propósito, está muito estritamente conectada com o Ahamkara — é uma faculdade, recentemente desenvolvida. A simplicidade a qual A.C. se refere não é a simplicidade da ausência de datum, mas a simplicidade da harmonização de toda parte particular na mente em um integrado, todo vivente. A fim de alcançar isto, a mente deve ir ‘aos lugares mais externos e submete todas as coisas’.

63. Que escuridão cubra a escrita! Que o escriba se vá em seus caminhos.

O consciente do escriba, até agora requerido para que ele pudesse registrar as palavras daquela parte de seu Ser que nós chamamos ‘o Adepto’ e as palavras do seu Anjo, é agora dispensada para que cuide dos seus afãs normais.

Estes ‘afãs normais’, todavia, não são os afãs de um ‘homem normal’, desde que a mente do escriba é uma mente iniciada.

64. Mas tu e Eu estamos deitados à vontade entre os vinhais; o que é ele?

O Adepto e seu Anjo permanecem no repouso do Êxtase: eles não deixam de existir quando o escriba não mais os percebe. Pelo contrário; ele lhes parece bastante irreal.

Esta é uma das razões porque o Anjo ordena a Consciência do Adepto para falar ‘muito’ com seu servente em LXV i 30-31. A menos que o contanto seja mantido, o escriba corre o risco de perder a si mesmo no fenômeno amorfo do mundo material, que pode somente adquirir significado do ponto de vista do Espírito.

65. Ó Tu Bem-Amado! não existe um fim? Não, mas existe um fim. Acorda! levanta-te! cinge teus membros, Ó tu corredor; leva a Palavra às cidades pujantes.

União com o seu Anjo não é o único fito do Adepto. Existe um ‘fim’, um Propósito próprio à sua individualidade. Portanto o Anjo ordena-lhe que se retire dos Trances de União. Ele deve assumir a forma de Hermes (corredor — o portador da Palavra) e entregar a Palavra que lhe foi confiada às ‘cidades pujantes’. Isto pode significar ‘às maiores mentes do mundo’.

Será notado que o Adepto ecoa as questões do ‘meninote louco’.

A mesma resposta é dada, não há fim a êxtase; mas há um ‘fim’ — um propósito — nele. Este é relatado no Juramento Mágico da A∴A∴, que todo membro é votado a ajudar a evolução da humanidade. O Adepto deve partilhar informações; não somente o método cientifico, mas também a ética cientifica de livre e completo partilhar de informações abertamente para todos, é Nosso caminho.

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