«Visão Nº 5» ¶
Nº 5[1]. “Depois de uma oração fervorosa fui carregado acima do círculo[2] que eu havia desenhado, através de uma atmosfera pesada e nebulosa. Logo, porém, o ar ficou mais puro e, pouco depois, encontrei-me em um céu lindamente claro.
“Ao encarar as profundezas do azul, vi alvorecer imediatamente acima de mim um grande círculo; então, de repente, quando olhei para longe de seu centro, deslizou em minha direção com velocidade intolerável a forma de um pastor; trêmulo e sem saber o que dizer, com voz vacilante, perguntei: ‘Por que vos apressais?’ Então veio a resposta: 'Há urgência!’ Então uma grande escuridão fechou meus olhos, e um horror de corrupção me envolveu, e tudo se derreteu no crepúsculo e ficou envolto na mais extrema escuridão. E da escuridão surgiu um homem vestido de azul, cuja pele era da cor de safira, e em torno dele brilhava uma luz de fósforo, e em sua mão ele segurava uma espada.
“E ao vê-lo aproximar-se, prostrei-me e implorei-lhe que me guiasse, o que, sem mais palavras, ele fez.
“Ao virar à esquerda, vi que perto de mim havia uma porta de pedra, e então, pela primeira vez, percebi que eu estava vestido com minhas vestes brancas[3]. Passando pela porta, encontrei-me na face de um alto penhasco que afundava nos abismos do espaço abaixo de mim; e meu pé escorregando na pedra lisa, eu tropecei para a frente, e com certeza teria deslizado para aquele abismo sem fim, se o pastor não tivesse me agarrado e me segurado.
“Então me foram dadas asas, e mergulhando daquele grande penhasco rochoso como uma ave marinha, eu voei meu curso pelo ar calmo e me enchi de uma grande alegria.
“Eu tinha viajado assim por pouco tempo, quando então ao longe apareceu diante de mim uma colina acidentada coberta de musgo prateado. E em seu cume havia um templo circular, feito de prata polida, abobadado e encimado por uma crescente. E por algum motivo desconhecido para mim, a visão da crescente me fez tremer tanto que não ousei entrar; e quando meu guia, que ainda estava comigo, viu que eu estava tomado por um grande medo, ele me consolou, ordenando para que eu tivesse coragem, então entrei com ele. Diante de nós, bem no centro do templo, havia uma mulher sentada cujo semblante era brilhante como a essência de muitas luas; e conforme eu a contemplava, o medo me deixava, então dei um passo em direção a ela e me ajoelhei reverentemente a seus pés.
“Então, enquanto eu me ajoelhava diante dela, ela me deu um ramo de oliveira e murta, que eu dobrei em meu coração; e, ao fazê-lo, de repente uma grande coluna de fumaça subiu do chão diante de mim e a levou embora pela cúpula do templo.
“Lentamente, o pilar se soltou, e nuvens de fumaça em espiral, rastejando para longe da poderosa coluna, começaram a circular ao meu redor, e eu voltei para onde meu guia ainda estava de pé. Então ele avançou e me fez sinal para segui-lo, entramos na grande coluna de fumaça e fomos carregados pela cúpula brilhante do templo.
“Continuamos subindo cada vez mais, através de regiões de nuvens e ar; subindo, subindo, passando pelas estrelas e muitas miríades de manchas de fogo ardente, até que finalmente nossa jornada nos levou a um vasto mar azul, sobre o qual repousava um navio de prata como se fosse um cisne branco. E, sem protelar nosso voo, dirigimo-nos para o navio e, descendo sobre ele, descansamos um pouco.
“Ao acordar, descobrimos que havíamos chegado a uma bela ilha, sobre a qual se erguia um vasto templo construído com blocos de prata, de forma quadrada, e cercado por uma poderosa colunata. Do lado de fora havia um altar sobre o qual um ramo havia sido sacrificado.
“Ao ver o altar, dei um passo em direção a ele e subi nele, e ali me sacrifiquei, e o sangue que tinha sido minha vida borbulhou para fora do meu peito, e escorrendo sobre a pedra áspera, foi sugado pelos lábios ressecados da areia branca… E eis que, ao me levantar daquele altar, eu estava sozinho de pé no topo plano do templo quadrado, e aqueles que estiveram comigo, o pastor e meu guia, haviam desaparecido; – eu estava sozinho… sozinho.
“E enquanto eu estava lá, o leste tornou-se como uma ametista apertada nos braços do sardo, e um grande arrepio percorreu-me; e enquanto eu observava, o sardo tornou-se como um cervo; e enquanto eu observava novamente, o leste estremeceu e o grande leão do dia rastejou sobre o horizonte e, agarrando o cervo entre seus dentes brilhantes, o sacudiu até que as nuvens felpudas acima fossem como a pele de um carneiro manchada de sangue.
“Então, emoção após emoção correu através de mim, e eu caí e me ajoelhei no telhado plano do templo. E logo quando me ajoelhei, percebi outros sóis nascendo ao meu redor, um no Norte, um no Sul e um no Oeste. E o do Norte era como um grande touro soprando sangue e chamas de suas narinas; e o do Sul era como uma águia arrancando as entranhas de um escravo núbio; e o do Oeste era como um homem engolindo o oceano.
“E enquanto eu observava esses sóis se erguendo ao meu redor, eis que, embora eu não soubesse, um quinto sol havia surgido abaixo de onde eu estava, e era como uma grande roda de relâmpagos giratórios. E contemplando a Maravilha que flamejava a meus pés, eu comunguei de sua glória e tornei-me brilhantemente dourado, e grandes asas de chamas desceram sobre mim, e quando me envolveram, cresci trinta côvados de altura – talvez mais.
“Então o sol sobre o qual eu estava ergueu-se acima dos outros quatro sóis e, ao fazê-lo, encontrei-me diante de um homem antigo com barba branca como a neve, cujo semblante estava inflamado de benevolência. E enquanto eu olhava para ele, um grande desejo tomou conta de mim para estender minha mão e tocar sua barba, e como o desejo cresceu forte, uma voz me disse: ‘Tocai, isso te é concedido’.
“Então estendi minha mão e gentilmente coloquei meus dedos sobre a venerável barba. E conforme eu fazia isso, o ancião se inclinou para frente, e colocando seus lábios na minha testa me beijou. E tão doce foi aquele beijo que eu teria demorado; mas fui dispensado, pois os outros quatro sóis haviam subido a uma altura igual à minha.
“E vendo isso, estendi minhas asas e voei, afundando através de inúmeras lâminas de prata ofuscante. E logo abri meus olhos, e tudo ao meu redor era como uma névoa densa; assim, voltei ao meu corpo”.
Terminada a visão, foi oferecido um agradecimento.
Capítulo traduzido e anotado por Alan Willms em janeiro de 2023. Foto ilustrativa de Mohamad Babayan no Unsplash.