Quase tudo que sei sobre o Mote Mágico

Este artigo é um capítulo de Quase Tudo que Sei Sobre a A∴A∴

O Mote na A∴A∴; exercício da escolha; influência do mote; como escolher um mote; um exemplo pessoal.

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Quase tudo que sei sobre o
Mote Mágico

Neste artigo é abordado

  • Contexto
  • O Mote na A∴A∴
  • Exercício da Escolha
  • Influência do Mote
  • Como escolher um Mote
  • Um exemplo pessoal

Contexto

Do Latim muttum “resmungo, grunhido”, e posteriormente do Italiano Motto e do Francês “Mut” ambos significando “palavra ou breve sentença”, o mote diz respeito ao lema de um indivíduo ou grupo — seja um pequeno grupo social ou grande como uma coalizão de nações.

Amplamente usados na heráldica ao compor uma bandeira ou brasão, o mote busca expressar em uma palavra ou sentença curta os objetivos, tradições ou valores que regem quem o usa, servindo de guia e de motivação para si, e para instigar aqueles ideais ou causar o temor destes em quem o ouve.

Quase sempre são em Latim, ou alguma língua exótica. No meio místico/mágico é bastante comum encontrar motes em Hebraico, Sânscrito, Enoquiano, entre outros. Este nome mágico visa expressar a Grande Obra da pessoa que o assumiu e a que se dedica tão bem quanto essa pessoa a conheça.

É comum que se use motes diferentes em diferentes Ordens ou graus das mesmas, já que o trabalho central das ordens e dos graus mudam. Também existem motes mágicos específicos para certos trabalhos públicos, como pseudônimo com o qual assinará algum escrito por exemplo. Isso é útil tanto para separar na própria mente ou na de outrem os objetivos de cada trabalho, quanto para situações em que se deseje discrição.

O Mote na A∴A∴


Juramento de Probacionista de Soror ECTAI (Jane Wolfe) — astrumargenteum.org

Na Santa Ordem, o Juramento de cada grau é selado com a assinatura do mote daquele que o toma.

O Item 2 do Juramento/Tarefa de Probacionista inclui que “deverá escolher com profunda ponderação e intensa solenidade um mote.” A importância da escolha do mote é tal que esta instrução é dada no Item 2, que nos demais Juramentos/Tarefas de Neófito até Dominus Liminis discorre sobre testes e exames pelos quais os aspirantes devem passar.

Posteriormente ao tomar o Juramento de Neófito, é dito que “Ele escolherá um novo mote com profunda ponderação e intensa solenidade, expressando a consciência mais clara de sua Aspiração que o ano de Probação lhe deu.”

No original em inglês “he shall choose a new motto” é uma expressão imperativa que parece ir além da mera sugestão. Parece indicar que o futuro Neófito não deveria manter o mote antigo. Ainda assim, alguns Irmãos após a devida reflexão insistem que o mote antigo é ideal para mais este grau. Ao meu ver não faz sentido que um futuro Neófito que realizou o trabalho à contento seja barrado por esta razão ou precise escolher um novo mote por mera burocracia. Se é esse o caso, que ele dê provas com o melhor de sua compreensão de que o mote é de fato adequado, e que seu Instrutor o oriente.

Nos graus seguintes não há instrução sobre mudança de mote, mas é prática comum que em cada grau se tome um mote em harmonia com o trabalho daquele grau em particular, e que carregue a evolução do entendimento do indivíduo na medida em que avança.

Como exemplo, cito os motes mágicos de Crowley

  • Perdurabo (Eu perdurarei) — 1=10 até 4=7 Golden Dawn
  • Parzival (Da lenda do Graal, o Tolo) — 5=6 Golden Dawn
  • O.S.V. (Ol Sonuf Vaoresagi, Eu reino Sobre Ti) — 6=5 Golden Dawn
  • Satan-Jeheshua, Aum-Ha — 5=6 A∴A∴
  • OU MH — 7=4 A∴A∴
  • V.V.V.V.V. (Vi Veri Veniversum Vivus Vici) — 8=3 A∴A∴
  • To Mega Therion (A Grande Besta) — 9= 2 A∴A∴

Exercício da escolha

Considere entre muitos rótulos e etiquetas que você carrega, quais você escolheu. Você é chamado “brasileiro”, é chamado “filho de fulano”. Talvez seja conhecido por características físicas como “pardo”, “alto”, “magro”. Quem sabe por suas habilidades como “bom em informática”, “fala bem em público” ou traços de personalidade como “introspectivo” ou “emotivo”. São todos rótulos que refletem o que os outros vêem em você. Você não escolheu nada disso. Você — salvo raras exceções — não escolheu sequer o nome que consta na sua identidade.

A escolha do Mote Mágico, ainda que não trouxesse mais nenhum efeito além deste, seria um ato de escolha. Uma declaração da Vontade. Diferente de um nome que seus pais escolheram por senso de estética ou em homenagem a alguém, foi você quem escolheu um nome que é a expressão de sua alma após profunda ponderação e intensa solenidade.

Essa nome, ainda que não significasse mais nada, é um emblema de sua liberdade. Um lembrete de que você tomou em suas mãos as rédeas de sua própria vida. De que você definiu por si uma maneira de navegar a existência.

Influência do Mote

Sendo a declaração de sua missão — o seu lema! — e selando o seu Juramento, é de se esperar que esse nome traga à tona as influências que o fizeram escolhê-lo — tanto consciente quanto inconscientemente. Vemos muitos Irmãos escolhendo nomes poderosos e glamourosos sem considerarem o outro lado da moeda.

Digamos que alguém escolha como mote “Hércules”. Provavelmente ele estará consciente de que o nome reflete força física, tenacidade, heroísmo, divindade, aclamação, prevalência sobre os adversários. Mas é bom que ele considere os aspectos menos positivos do nome, como o afastamento da figura paterna/divina durante a juventude, os ciúme mortal de Hera do qual ele é vítima, a destruição de sua família humana por suas próprias mãos, a dor e a loucura que tal destruição causou, os doze trabalhos quase impossíveis sem os quais ele não poderia se redimir, etc.

Tenho visto frequentemente entre os Irmãos sob minha instrução a tomada de um mote no qual estejam contidos muito mais elementos do que ele considerou ao assumi-lo. Na medida em que se revelam, esses aspectos expõe Ordálias — sobre as quais você pode ler aqui — com as quais o indivíduo deve lidar, assim como indicações de sua Natureza e Poderes. É sempre bom revisitar o assunto do mote e se perguntar o que você descobriu a respeito dele que ainda não soubesse quando o assumiu.

Como escolher um Mote Mágico

Não existe resposta final para essa questão. O que a experiência tem me demonstrado é que por algum tempo você debate internamente com diversas ideias tentando encontrar aquela que pareça “a certa” e eventualmente a resposta surge com um encaixe extremamente satisfatório, e o indivíduo sabe que aquele é o mote adequado. Para chegar nesse ponto, é comum que se aplique diversos métodos — isolados ou combinados — na busca. Falarei sobre os mais comuns:

Cosmogonia e mitologia

Uma vez que o indivíduo definiu seu entendimento da Grande Obra que pretende realizar sob aquele mote mágico, ele poderá buscar nas teorias da criação do universo e nas mitologias o nome de algum conceito, ideia ou figura que pareça estar em harmonia com aquela ideia. Não é raro encontrar quem tenha escolhido o nome de alguma divindade ou iluminado da mitologia egípcia, hindu, greco-romana, nórdica, indígena, etc.

Exemplos: Hoor, Ganesh, Artemis, Thor, Tupã, etc.

Uma expressão

Certos indivíduos conseguem resumir em uma palavra ou expressão aquilo que entendem como a essência de sua Grande Obra. Essa expressão quase sempre está em outro idioma ou é traduzida para outro idioma, seja pela história inerente àquela língua, por senso de estética, ou simplesmente por “soar mais mágico”.

Exemplos: Perdurabo, Adjuvo, Vi Veri Veniversum Vivus Vici, Ignis, etc.

Gematria, Numerologia e outras correlações

Aqui o indivíduo procura um nome que se encaixe em um valor numérico relativo a alguma fórmula mágica, ou análogo ao de outra palavra que coadune com a sua Grande Obra, ou então tenta descobrir quais os valores numéricos inerentes ao mote escolhido e suas correlações. Por essa razão é comum encontrar o padrão Mote-Número, como “Fulano 123”. O número também ajuda a distinguir entre motes de pessoas diferentes que se abreviam pela mesma letra inicial.

Algumas das fórmulas mágicas mais comuns são Adonai, LVX, SAG (65), Nu (56), Babalon (156), Abrahadabra (418), e obviamente Lashtal / Thelema / VIAOV / Agape / Mgn (93). Caso o assunto das fórmulas mágicas seja desconhecido, um bom ponto para iniciar os estudos é o Liber ABA, Parte II, Capítulo II.

Exemplos: F. 418, H. 418, Frater 273, etc.

Explorando estados alterados de consciência

Alguns indivíduos buscam por seu mote em planos alterados de consciência como num sonho (lúcido ou não), viagem na visão do espírito, transes hipnóticos ou sob o efeito de psicoativos. Outros o recebem espontaneamente ao experimentar um estado alterado de consciência ou pelas sincronicidades que surgem no dia a dia. Desde algo claro como ouvir “Seu nome é Fulano!”, como algo mais abstrato quanto receber uma numeração a ser estudada, um símbolo, uma interação com algum animal, etc.

Motes que provavelmente se enquadram nessa categoria são esses cujo significado não se abstrai facilmente, tais como talvez sejam: Meral, Belarion, Iovehaum, etc.

Uma lista com muitos exemplos de motes de frati conhecidos do passado que se encaixam em uma ou outra dessa categoria pode ser encontrada aqui.

Um exemplo pessoal

Para o mote de minha Probação fui buscar no budhismo vajrayana a figura de Acalanatha, do sânscrito “Senhor inabalável (da sabedoria)”. No japão é conhecido como Fudō Myōō, e tido como uma espécie de “padroeiro” e “guardião” das artes guerreiras, o que para mim enquanto artista marcial e de personalidade belicosa caía como uma luva.

O que eu não sabia sobre Acalanatha é que ele é reputado como o “destruidor das ilusões”, e que representa o adversário mais formidável que um guerreiro pode enfrentar: O próprio indivíduo com suas fantasias, ilusões, expectativas, medos, limitações auto-impostas, etc. Durante a Probação as ilusões foram sendo destruídas, minhas fraquezas ficaram expostas, e precisei enfrentar e conquistar a mim mesmo em cada degrau do processo. Fui entendendo por que a imperturbabilidade de Acalanatha vinha da sabedoria. A sabedoria de si mesmo.

Quando chegou a hora de tomar o Juramento de Neófito, eu tinha uma vaga noção de que todo o trabalho da Primeira Ordem — de Neófito até Dominus Liminis — servia ao propósito de conduzir o aspirante ao Adeptado, então decidi expressar minha Grande Obra pessoal através de seis letras, pois seis é o número de Tiphereth, que além de representar o Sol interior, é onde se encaixa o grau de Adeptus Minor no mapa da Árvore da Vida.

Como o que eu conhecia de minha Verdadeira Vontade era na melhor das hipóteses apenas a ponta do iceberg, defini que o meu fito seria Formular e Compreender Minha Vontade Rápida e Eficientemente”FCMVRE.

Havia a intuição de que nada poderia ser deixado de fora, e portanto eu deveria dar passos firmes em cada etapa, voltando para recuperar o que ficasse para trás, focado em qualidade e não em avanço indiscriminado, e não me permitindo pular etapas. Para isso, a mesma fórmula poderia ser mantida apenas adicionando às duas primeiras letras mais significados: Formular Completamente (…)”.

Certamente que na medida em que minha Vontade fosse se descortinando diante de mim eu deveria realizá-la, mesmo o pouco que eu fosse conhecendo dela. Novamente, poderia manter a mesma fórmula, adicionando os significados Fazer Cumprir (…)”.

Para tornar esse nome pronunciável, adicionei vogais que transformassem a fórmula original na expressão “Fac Movere_”_, que em latim vulgar quer dizer “Eu faço mover”, “Faço o movimento”. Caiu como uma luva já que a prática me interessa mais que a teoria, e a experiência me dá mais prazer do que filosofar. Dessa forma meu mote refletiria também minha inclinação à ação e ao Karma Yoga.

Apliquei a gematria para descobrir a numeração e “Facmovere” somou 419 (tão perto!) então estrategicamente removi o “e” que não fazia parte da fórmula original. O resultado final do mote foi Facmovre = 418, reafirmando meu compromisso com a Grande Obra, e reafirmando o fito em Tiphereth.

Agora o Mote continha: Formular e Compreender, Formular Completamente e Fazer Cumprir minha Vontade Rápida e Eficientemente, em latim significava ação, e continha a numeração da fórmula 418, ABRAHADABRA, a palavra do Aeon, a Grande Obra completa. Um mote adequado a todo o trabalho da Primeira Ordem cujo fito é o Adeptado. Por fim, o mote abreviado é “F”, a sexta letra do alfabeto, mais uma confirmação da relação com Tiphereth.

Esse mote por sua estrutura se tornou minha espada e meu escudo, meu grito de guerra, minha bússola, e a cada dia tem se revelado para mim em novas permutações de significado que não falham em me deixar maravilhado.

Oportuno ao assunto, algumas pessoas me perguntam o que significa o meu selo — a minha assinatura — que acompanha minhas ilustrações:

Não, não é um sigilo, ao menos não no sentido de que contenha alguma “programação” ou ative algum servidor. É um “F” estilizado para expressar algumas ideias relativas ao meu Mote e meu trabalho iniciático.

Da esquerda para direita, primeiro temos o “F” e em seguida o 418, ambos já explicados. A seguir o símbolo do infinito aludindo à Nuit, Nossa Senhora do Espaço Infinito, Sacerdotisa da Estrela de Prata. Logo depois uma Cruz de Salém, um glifo para o qual um dos significados de suas 8 pontas e 3 intersecções é o número 11 que é a redução pitagórica de 56 (Nuit), e em cuja forma podemos perceber a Árvore da Vida entre outras coisas. A seguir o símbolo do Enxofre que na alquimia é um princípio ativo, age na corrosão dos metais e na combustão, aludindo à fórmula de V.I.T.R.I.O.L. Por fim o Falo, a Baqueta, símbolo da força criadora do Amor direcionada pela Vontade.

Conclusão

Seu mote pode ser só um nome pomposo com uma sonoridade legal, ou pode ser a palavra mágica pela virtude da qual tu desenhará a planta do seu Templo. Que apenas a menção dela seja capaz de colocar os espíritos de discórdia em ordem, prontos para trabalhar com disciplina e regularidade na Grande Obra. Que por esta palavra se possa destruir toda falsidade e iluminar seu universo com as emanações da Lei.


Perguntas e Respostas

Pergunta de Marco Damaceno:

P. Caro Frater F. Por exemplo, se eu ou qualquer outro irmão nos identificamos com os princípios inerentes a mottos de outras pessoas, como fratere e sorore do passado… há algum impeditivo de usá-los? 93!

R. Não vejo nenhum impedimento, e isso inclusive acontece bastante. O importante é que essa identificação seja legítima, pessoal, íntima. Nunca motivada por algum tipo de culto à personalidade do dito Frater ou Soror.


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